O TERRITÓRIO QUE OS VITORIOSOS ISRAELITAS IRIAM OCUPAR JÁ havia sido habitado há muitos séculos, como resultado das incursões periódicas feitas pelos povos semítícos do norte da Mesopotâmia. Mesmo antes do início do terceiro milênio a.C, a localização de Jebus (mais tarde Jerusalém), Gebal, Gezer e Bete-Seã já havia sido estabelecida e, no segundo milênio, o país havia sido ocupado pelos amorreus, heteus (ou hititas), horeus e por alguns grupos semíticos menores. Os habitantes se referiam ao seu país como Canaã, ou Kinakhna, como era chamada nas tábuas de Amarna, e esta era a designação mais antiga da Palestina, um nome pelo qual a terra se tornou conhecida depois da ocupação dos filisteus no século XII a.C. O nome Canaã, que aparece nos textos bíblicos e egípcios era, provavelmente, de origem hurriana, e pode ter significado “terra da púrpura”, uma alusão ao uso dos moluscos “murex” na indústria de corantes da Fenícia. As fronteiras da Canaã, sugeridas em Gênesis 10.19, incluíam todo o território que se encontra a oeste do Jordão, entre Gaza e Sidom, embora as cartas de Amarna se referissem a Canaã primeiramente em termos da costa Fenícia.
Características Geográficas
As características geográficas da terra estavam de acordo com um padrão irregular de quatro faixas paralelas, limitadas pelo mar Mediterrâneo e o Deserto da Arábia. Essa divisão foi causada pela presença de duas cadeias de montanhas, uma das quais se estendia desde as Montanhas do Líbano, ao longo da margem ocidental do vale do Jordão, até o lado oriental do mar Morto, e continuava até o monte Hor, em Edom. Dessa forma, essas seções paralelas formavam a faixa costeira chamada Planície Marítima. A cadeia central de montanhas se estendia em direção ao sul, desde as Montanhas do Líbano, o vale do Jordão e o Planalto da Palestina oriental, e continuava até o lado ocidental desde o Monte Hermom até o Monte Hor. Ao norte do Monte Carmelo, a planície costeira se estreitava consideravelmente, mas ao sul ela se alargava gradualmente até Gaza e se estendia até cerca de vinte e cinco quilômetros em direção ao interior. Mais ao sul, encontra-se o árido distrito do Neguebe, uma área de cerca de 920 quilômetros quadrados de extensão. Antes da conquista israelita havia várias cidades importantes localizadas ao longo da rota comercial costeira, mas a maioria das cidades habitadas se encontrava no montanhoso distrito central
Essa era uma área irregular, cortada por vales ou wadis. Estava coberta por florestas, portanto seu valor para a finalidade agrícola era limitado, e só servia como pastagem para as manadas e os rebanhos. Por volta do século XÜI a.C, as terras altas a leste do Jordão eram aparentemente bem populosas e era nessa região que podiam ser encontrados os poderosos reinos de Basã, Amom, Moabe e Edom. Nessa época, as terras a oeste do Jordão foram colonizadas desde Berseba até Laís (Dã), numa distância de duzentos e quarenta quilômetros. Os cananeus mostravam uma acentuada preferência pelas terras baixas e evitavam sempre que possível os distritos montanhosos que nessa época já eram esparsamente habitados.
As Cidades-Estado de Canaã
Como, na antiguidade, a posição ocupada pela Palestina fazia uma ponte terrestre entre a Ásia, África e Europa, estava, por isso, sujeita a um contínuo movimento de povos. Seus parcos recursos naturais contrastavam desfavoravelmente com a fertilidade do vale do Nilo, ou da planície da Babilônia, no entanto, gozava de uma importância tática que nenhuma outra terra do Oriente Próximo possuía. Durante muitos séculos, os grandes impérios usaram a terra de Canaã como se fosse um estado tampão para se protegerem contra as ambições militares dos seus agressores, ou como uma cobiçada base avançada a partir da qual poderiam iniciar um programa de expansão imperial.
Dessa forma, a Palestina desempenhava um importante papel ao preservar o equilíbrio de poder no Oriente Próximo, e é difícil superestimar o valor estratégico que cabia àquela acidentada terra e àquele território muitas vezes inóspito.
Parece que a mistura de amorreus, heteus, jebuseus e de outros povos, que haviam entrado na terra de Canaã durante a primeira parte do segundo milênio, tornou-se mais pronunciada por volta de 1600 a.C. Nesta época a maioria dos imigrantes havia consolidado suas colônias no país e estava começando a tirar vantagem da maneira como o reino Mitani controlava o equilíbrio do poder no Oriente Próximo, por volta de 1550 a.C, a fim de se assegurar como povo independente. Até certo ponto, isto era encorajado pela administração egípcia da Palestina, depois da expulsão dos hicsos, pois administradores nativos receberam permissão de organizar a economia das suas cidades-estado segundo uma orientação feudal. As incessantes disputas, que tiveram lugar entre esses insignificantes reinos, eram toleradas pelos egípcios desde que impedissem o surgimento de poderosas coalizões cananitas e permitissem um contínuo fluxo de impostos ao tesouro Egípcio.
A cultura das cidades-estado pode ser traçada até o terceiro milênio e, por causa da estratégica posição da Palestina, foi capaz de exercer considerável influência sobre as demais nações do Oriente Próximo durante sucessivos séculos. A partir do quarto século a.C, uma crescente influência semítica passou a se refletir na vida religiosa do Egito, e, como resultado, a adoração aos deuses cananeus Baal, Anate e Astarote tornou-se muito popular. Esses deuses se identificavam com as divindades egípcias Set, Neftis e Isis e eram adorados na capital Avaris-Tânis durante a Décima Nona Dinastia. Muitas vezes funcionários egípcios ostentavam nomes com distinta característica semita e um dos comissários egípcios na Palestina, durante o período Amarna, era um homem chamado Yanhamu, cujo nome pode ter recebido uma herança semítica.
Podemos reconhecer a natureza cosmopolita de Canaã pelo fato de terem sido empregadas, durante o período Amarna, quatro escritas distintas nas anotações dos cananeus, além do estilo acádio e egípcio, conforme já observado.2 Neste período a influência da terminologia semítica foi considerável, e documentos egípcios do décimo terceiro século a.C. continham um grande número de palavras semitas. Embora seja verdade que as tábuas de Amarna forneceram importantes informações sobre a língua de Canaã, que variava apenas ligeiramente em relação ao dialeto semítico dos hebreus, a descoberta de tábuas de argila e de outros artefatos em Ras Shamra, colocou a Idade Amarna de Canaã sob uma perspectiva inteiramente nova.
Ras Shamra (Ugarite)
No segundo milênio a.C, a cidade de Ras Shamra era conhecida como Ugarite e, pelo fato de estar localizada na costa norte da Síria, havia se tornado um florescente centro comercial e cultural. Depois de sua destruição pelos filisteus, por volta de 1200 a.C, ela desapareceu das páginas da história até a descoberta das cartas de Amarna em 1887. Mas foi somente quando Schaeffer desenterrou algumas tábuas em Ras Shamra, em 1929, que a importância deste lugar se tornou aparente. As tábuas encontradas tinham inscrições cuneiformes de vários tipos e, de acordo com o costume acádio da Mesopotâmia, os escritos eram feitos da esquerda para a direita. Centenas dessas tábuas foram escavadas depois de 1929 e aquelas que continham a então desconhecida língua ugarítica foram trabalhosamente decifradas. Acredita-se que o dialeto ugarítico, assim como o hebraico, aramaico e outros dialetos cananeus pertenciam ao ramo noroeste do grupo de linguagem semítica. As tábuas tinham a data da primeira terça parte do décimo quarto século a.C, embora tenha sido reconhecido que a escrita empregada exibia uma data um pouco anterior àquele período.
A escrita cuneiforme, encontrada nas tábuas ugaríticas, tem a sua importância pelo fato de exibir uma natureza alfabética e não silábica. Aos antigos egípcios tem sido geralmente atribuída a introdução da escrita alfabética, mas na prática eles a combinavam com um sistema silábico de escrita (onde cada sinal representava uma sílaba) e logográfico (onde cada sinal representava uma palavra), para produzir a complicada escrita dos hieróglifos, que se tornou muito conhecida desde a antiguidade. Parece que os cananeus foram os primeiros a empregar o princípio de um alfabeto sob a forma cuneiforme. Através dos hebreus e dos fenícios, ele foi transmitido aos gregos que o modificaram e lhe deram as características da forma clássica. Talvez a necessidade de responder às demandas do comércio internacional tenha levado à adoção de uma nova variedade de escrita cuneiforme em Ugarite, pois certamente ela era mais conveniente ao uso do comércio que a incômoda escrita da Mesopotâmia.
Quando o sítio arqueológico de Ugarite estava sendo escavado, veio à luz parte dos escritos da livraria real, contendo várias centenas de tábuas de argila, algumas das quais estavam escritas no antigo dialeto cananeu que antecedeu a era de Moisés. Não seria exagero afirmar que essas tábuas, escritas numa linguagem semítica desconhecida na antiguidade, e transcrita numa estranha forma cuneiforme, representaram a descoberta mais importante no campo da antiga literatura durante o presente século. Seus textos incluíam poesia e prosa, sendo que o primeiro grupo era formado por ciclos mitológicos e lendas que tratavam de deuses e de homens, enquanto as composições em forma de prosa tratavam de tópicos tão amplamente divergentes como a propriedade da terra, os impostos, o serviço militar obrigatório e a prática veterinária.
As Poesias Ugarítica e Hebraica
file:///E:/Desktop/zzzz/3%20R%20K.%20Harrison%20-%20Tempos%20do%20Antigo%20Testamento-desbloqueado.pdfA maior parte das composições literárias exibia uma característica forma poética de particular importância por conter um grande número de semelhanças com a gramática, o estilo e o uso verbal da poesia hebraica. Esse seria, em especial, o caso dos primeiros poemas do Antigo Testamento cuja semelhança de estilo e de vocabulário, entre o formato dos seus versos e os da literatura ugarítica, é mais surpreendente. Como resultado, tornou-se evidente agora que as aparentes anomalias textuais, consideradas pela crítica dos estudiosos como presentes nos Salmos e outras composições poéticas hebraicas, não correspondem a uma verdadeira corrupção do texto hebraico. Ao contrário, em sua grande maioria, eles são interpretados como precisas reflexões das peculiaridades da gramática e da forma de falar dos cananeus, cujo significado havia sido perdido no decorrer do tempo. Assim sendo, as retificações textuais feitas por Kittel e outros estão exigindo uma drástica revisão à luz das evidências apresentadas pelos textos de Ras Shamra. Uma característica familiar da poesia hebraica consiste no paralelismo de um padrão repetitivo, como está mostrado no Salmo 92.9:
Pois eis que os teus inimigos, Senhor,
Eis que os teus inimigos perecerão;
Serão dispersos todos os que praticam a iniquidade.
Cuja semelhança com um verso do Épico de Baal e Anat (68.5 e seguintes) pode ser observada:
Eis que os teus inimigos, ó Baal,
Eis que os teus inimigos irás derrotar.
Eis que irás conquistar os teus adversários.
Esse é um padrão característico, repetido frequentemente e com algumas variações, nas poesias hebraica e ugarítica. Uma comparação feita entre as duas tradições literárias indica que, do ponto de vista linguístico, gramatical e sintático, o dialeto cananeu de Ugarite está intimamente relacionado com o hebraico do Livro dos Salmos, do qual Davi é o autor da maioria deles. Formas arcaicas dos Salmos têm sua contrapartida nos mitos pagãos de Ras Shamra, enquanto semelhantes combinações de palavras, organizadas em termos das mesmas forças poéticas, também podem ser encontradas tanto nas composições hebraicas como nas ugaríticas. Em seu todo, entretanto, existe uma espontaneidade mais evidente ligada à poesia hebraica, e uma ênfase menor nas considerações puramente estilísticas que podem ser encontradas nos mitos de Ugarite.
Em vista da abundância de semelhanças existentes entre a poesia ugarítica e a poesia hebraica, e também da notável semelhança na linguagem e nas formas de pensamento, torna-se evidente que os cananeus e os hebreus tiraram sua inspiração, cada um de uma forma um pouco diferente, da mesma variedade de expressão linguística e idiomática. Embora a teologia dos escritos hebraicos seja totalmente diferente, no sentido de ser declaradamente monoteísta, existe muitas vezes um notável grau de semelhança entre as descrições de Jeová e aquelas dos deuses ugaríticos. Da forma que o Senhor é mencionado em textos dos Salmos, como estando “cavalgando sobre as nuvens” (cf. Salmos 68.4; 104.3, versão ARA), assentado num trono no céu (cf. Salmos 2.4; 103.19), e enviando raios e trovões (cf. Salmos 18.13; 77.18; 144.6), Baal é também assim comparado em textos pagãos.
Essa comunhão de interesses literários deu origem a um critério novo e independente para classificar a data do primeiro material poético da Bíblia hebraica. Um exemplo disso pode ser encontrado no cântico de Moisés e Miriã (Êxodo 15) o qual, até recentemente, havia sido datado pela crítica dos estudiosos como pertencente ao período subsequente à construção do primeiro Templo por causa da referência feita ao “monte da tua herança” (v. 17) que foi interpretado como sendo o Monte Sião. Mas a descoberta da frase “o monte da minha herança” (‘nt 111.25 e seguintes), feita no Épico de Baal cananeu, usada como referência ao remoto lar de Baal ao norte,” mostra que essa descrição era mais poética que topográfica, eliminando assim o obstáculo a uma data dentro do período de Moisés, ao qual ela apropriadamente pertence. Uma data anterior também deve ser atribuída a outras manifestações poéticas como os oráculos de Balaão (Nm 22—24), a bênção de Jacó (Gn 49), e a oração final de Moisés (Dt 33).
Contudo, é significativa a divergência que existe entre o texto hebraico e o mito pagão, pois o salmista afirma fluentemente a superioridade do Deus de Israel, e se alegra com a destruição dos monstros e dos seus supostos poderes mágicos. Entretanto, são poucas as tais alusões às lendas pagas e elas nada representam além de um exercício do imaginário com o fim de intensificar o efeito poético geral. Esse artifício tem um óbvio valor estilístico e foi apreciado, entre outros, por Milton que incorporou muitas alusões feitas à mitologia paga às suas composições literárias. Deve-se notar, entretanto, que as referências feitas aos mitos pagãos e aos objetos de culto na literatura poética hebraica são, de forma geral, de tipo injurioso, em consonância com o monoteísmo ético dos escritores.
——- Retirado de R. K. Harrison – Tempos do Antigo Testamento.
Leia também:
- A Religião dos Cananeus
- Canaã e o Deserto
- Data do Êxodo
- Os Patriarcas na Palestina
- Israel No Egito
- Do Egito Antigo ao Período de Amarna
- Os Heteus (ou Hititas)
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Núcleos Narrativos de Anthares
A lista abaixo está em ordem cronológica, de acordo com a linha temporal do Universo Anthares.
PERÍODO PRÉ-DILUVIANO
• A Grande Equação
• A Criação das Dimensões
• A Insurgência e a Separação dos Acsï
• Jauz, o Portal e os Drishs
• Sete nasce – (≈ 3670 a.C.)
• Suméria fundada – (≈ 3316 a.C.)
• O Clã Hakal
• Mafug e Novo Mundo
• As Águas de Agazohu
• A Queda de Rohä
• Os Nefilins e o Guardião do Portal
• As Conquistas da Fúria
• A Fundação de QeMua
• Noé nasce (≈ 2744 a.C.)
• O Anúncio da Sentença
• O Selamento do Portal – (≈ 2590 a.C.)
• A Comunidade da Muralha
• Os Sinais dos Tempos
• A Pirâmide de Quéops – (≈ 2330 a.C.)
• Uni, o grande general egípcio (2300 a.C.)
• A Descoberta dos Ambientes Não-físicos
• O Dilúvio – ano 1656 (≈ 2144 a.C.)
• A Contenção de Rohä
DO OUTRO LADO DO PORTAL
• Hakais e QaFuga
• O Vale das Preces
• O Mago de Cipre
• A Guerra das Noites
• A Garganta de Maltam
• O Campo dos Lamentos
• Dia de Sangue
• O Mistério dos Pinages
• O Silêncio
• Drishs Avançam (RPG)
• Os Três Lendários
DO LADO DE CÁ DO PORTAL
(e itens históricos de referências cronológica)
• Caídos – A Segunda Crise
• A Comunidade Oculta
• Os Dragões Europeus
• A Confusão das Línguas
• Babel vira Babilônia – 1803 a.C.
• Ínaco funda Argos – 1802a.C.
• O Banimento dos Gigantes
• Hamurabi assume o trono – 1767 a.C.
• O Mercenário de Sodoma
• As Atas da Disputa
• O Guardião da Floresta
• Hércules mata Busíris¹ – 1471 a.C.
• Peste dos Filisteus – 1320 a.C.
• Êxodo dos hebreus – 1260 a.C.
• Isdras, o Herói da Nação – ≈ 1000 a.C.
• O Guardião da Lua
• A Origem do Japão – 697 a.C.
• As Sentinelas de Takeshi
• Buda nasce – 560 a.C.
• Jesus¹ nasce – entre 4 e 7 a.C. (pois é)²
• A Peste Antonina – 165
• A Migração dos Teutões – 350 –
• A Praga de Justiniano – 541
• Peste e Ódio – 1218
• A Orda Mongol contra os Samurais – 1274
• O Contrato de Salém – 1693
• Grande Peste de Marselha – 1720
• O Exorcista do Velho Oeste
• Constantin von Tischendorf – 1844
• Guerra Anglo-Zulu – 1879
• Grande Sismo de Kantō – 1923
• A Segunda Guerra e o Vesúvio
• Pandemia de Mortos Vivos
• Os Pequenos Sacerdotes
• A Morte de Edmundo Pinto e Ulysses Guimarães
• Chacina em Santo André
• Psy e Químico
• O Julio na Gaita e a Bicharada
• O Ponto de Étretat
• Sequestros em Mateiros
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• O Guardião de Tóquio
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