O Líder Josué

Quando as bases legais para a vida israelita posterior já haviam sido estabelecidas, e os peregrinos hebreus já tinham montado seu acampamento, estava terminada a tarefa do grande legislador hebreu. Depois de ter admirado o panorama da Terra Prometida, no monte Nebo, identificado atualmente com o moderno Khirbet ei-Mekhaiyet, Moisés morreu e foi enterrado em Moabe. Pouco antes da sua morte, ele havia consagrado Josué como seu sucessor, que assumiu uma completa liderança sobre os israelitas. A conquista de Canaã era o seu supremo objetivo, para tanto, elaborou planos imediatos para cruzar o Jordão e atacar Jerico. A captura dessa fortaleza representava um pré-requisito para o sucesso militar em Canaã, pois estava situada entre os penhascos do deserto da Judéia, num local que dominava a entrada não só para o planalto de Jerusalém, como também para toda Canaã.

O local da antiga Jerico (Tell es-Sultan) foi cenário de considerável atividade arqueológica durante o século 20 da nossa era. Em 1907, a German Oriental Soaety enviou Sellin e Watzinger para ali realizar algumas escavações que resultaram em um relatório bem documentado sobre a Idade Média do Bronze em Jerico. O trabalho ainda incluiu uma detalhada descrição dos objetos — já recuperados — de cerâmica. Essas escavações foram interrompidas depois de dois anos, e novamente recomeçadas em 1929 pelo Professor Garstang da Universidade de Liverpool. Nos sete anos seguintes vários níveis desse sítio foram pesquisados e foram dadas designações alfabéticas às diversas camadas que estavam sendo escavadas. Em 1952 esses trabalhos foram continuados por um grupo de arqueólogos americanos e ingleses sob a direção da senhora Kathleen Kenyon, diretora da British School of Archaeology em Jerusalém.

Essas escavações atingiram os níveis de habitação de até, pelo menos, o quinto milênio a.C, indicando que esse local era o mais antigo de todo o Oriente Próximo. Enquanto outros povos estavam apenas no início de uma vida em comunidades localizadas em vilas desprotegidas, os habitantes da Era Neolítica de Jerico estavam vivendo numa cidade murada cuja área cobria cerca de oito acres. As evidências de uma atividade comunal Neolítica precedente à atividade cerâmica se avolumaram com a descoberta, em 1956, de um grande fosso de defesa, com cerca de trinta pés de largura, escavado a uma profundidade de oito pés através do leito rochoso. Sobrepondo-se a esse fosso existia um muro com dezoito pés de altura, sobre o qual havia sido erguida uma fortaleza circular de pedra. A cultura desse período era do tipo de “irrigação”, capaz de produzir grãos como painço, cevada, trigo e frutas subtropicais, inclusive figos, tâmaras e uvas.

É provável que a localização da antiga Jerico tenha contribuído para sua prosperidade, pois estava localizada na junção de várias rotas cruzadas pelas caravanas orientais que transportavam especiarias. Sua importância estratégica já havia sido estabelecida na antiguidade remota, pois montava sentinela sobre uma das mais importantes e permanentes passagens através do rio Jordão. Do lado oriental, Jerico estava protegida pelo planalto que formava as terras altas de Moabe, enquanto no sul se estendiam as cadeias estéreis que estavam às margens do mar Morto. Esse mesmo sítio arqueológico estava localizado na fissura de um longo vale através do qual fluía o rio Jordão. Embora Jerico estivesse cerca de quinhentos pés acima do nível do mar Morto, ainda assim a sua localização correspondia a cerca de oitocentos pés abaixo do nível do Mediterrâneo.

No verão, a temperatura no fundo do vale atingia proporções tropicais, enquanto no inverno o calor do ar, enclausurado nessa garganta, contrastava agradavelmente com o frio e a neve de Jerusalém, que estava situada vinte e sete quilômetros na direção sudoeste. Essas condições climáticas eram enriquecidas pela presença de uma nascente de água doce conhecida atualmente como ‘Ain esSultan, com sua perene fonte de água para aqueles que frequentavam esse local. Tradicionalmente, essa fonte foi purificada por Eliseu, e fornecia a única água da vizinhança que não tinha um paladar salobro.

Enquanto os hicsos dominavam Canaã, Jerico foi solidamente fortalecida com grandes aclives diante das fortificações, os quais eram usados como bases para atacar o império egípcio. Mas depois da expulsão dos hicsos do Egito (em aproximadamente 1550 a.C), Jerico se tornou uma das grandes cidades-estado de Canaã e era governada pelo seu próprio rei que, durante o período Amarna, estava sujeito ao controle administrativo do Egito. A natureza da organização feudal em Canaã não era saudável e, combinada com uma disputa mortal entre as várias cidades-estado, havia produzido um claro declínio no nível da civilização dos cananeus na época em que Josué e suas forças estavam se preparando para invadir essas terras. Embora as maciças fortificações erguidas pelos hicsos ainda estivessem evidentes em muitas partes do país, a fibra moral dos seus habitantes encontrava-se seriamente enfraquecida por séculos de guerras internas e pelos debilitantes efeitos do abandono a uma forma de atividade religiosa aviltante. Até certo ponto, o terreno já estava preparado para as vitoriosas campanhas de Josué e dos israelitas. Jerico foi o primeiro e, provavelmente, o mais formidável obstáculo à vitória, e seu destino era servir como indicação de que nada restava à essa terra, como um todo, se não esperar o momento em que o fervor israelita seria lançado contra a frágil resistência dos desmoralizados habitantes de Canaã.

——- Retirado de R. K. Harrison – Tempos do Antigo Testamento.


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