Israel No Egito

Apesar do fato de que muitos estudiosos tentaram refutar a historicidade de uma permanência prolongada de Israel no Egito, as condições históricas que existiam do século XIX a.C. no Oriente Médio e no Egito estão de pleno acordo com a tradição bíblica a este respeito. A ascensão da influência semita no Baixo Egito tinha culminado antes do final do século XVIII a.C. na dominação dos hicsos sobre as Duas Terras. E provável que a migração de Jacó para o Egito estivesse relacionada com o crescimento do poder dos hicsos, e se fosse este o caso, a ascensão de José à proeminência política teria sido uma questão, comparativamente, de pouca dificuldade. Mas a sorte semita no Egito foi revertida com a expulsão dos hicsos por Ahmósis I, e conforme fontes contemporâneas, os semitas que permaneceram na região do Delta eram escravizados, ou obrigados a trabalhar como camponeses na região da antiga capital dos hicsos.

Essa circunstância parece corresponder àquela descrita no primeiro capítulo do livro de Êxodo, embora a identidade do faraó “que não conhecera a José” não esteja clara, de maneira nenhuma. Certamente a escravidão dos hebreus teria começado com Amósis, mas a sua aflição atual, por supervisores egípcios, é mais provavelmente associada com a obra de construção em Pitom e Ramessés, sob o governo de Seti I e Ramsés II. Os espancamentos que os hebreus suportavam acrescentam um toque desafortunadamente autêntico à situação, pois este era o procedimento padrão na vida egípcia antiga para o encorajamento do progresso em qualquer tipo de trabalho. Apesar das condições sob as quais viviam, o número de hebreus crescia, e para interromper esta tendência, os egípcios promulgaram uma lei, visando a destruição de todos os filhos do sexo masculino, nascidos de mães semitas. Desta situação emergiu o bebê Moisés, que pouco tempo depois de seu nascimento foi escondido, por sua mãe, e colocado em um cesto feito de juncos em um ponto do rio que era usado pela filha de Faraó, que ali se banhava. Quando encontrou o bebê, ela o levou à sua casa, e o adotou, dando-lhe um nome egípcio, e o criou como tal. Este evento aconteceu diversos séculos antes da lenda cuneiforme (800 a.C.) de Sargão I, de Acade:

Minha mãe simplória me concebeu; em segredo, me deu à luz.
Ela me colocou em uma arca de juncos, com betume selou a tampa.
Ela me lançou no rio, que não veio sobre mim.
O rio me sustentou e me levou a Akki, que tirava água…
Akki, que tirava água, (me levou) como seu filho (e) me criou.

As narrativas que tratam da primeira parte da vida de Moisés são bastante conhecidas. Sua educação provavelmente se deu no círculo sacerdotal de Heliópolis, onde complexos temas do culto a Rá formariam os antecedentes de sua instrução. Há pouca dúvida de que ele tivesse se familiarizado com as crenças e práticas religiosas da Canaã antiga, que já exerciam considerável influência sobre a adoração no Oriente Médio. Ele também estaria em contato com os dialetos de Canaã, assim como a escrita cuneiforme da Babilônia, que era o veículo normal para a comunicação diplomática. Provavelmente Moisés estava familiarizado com as máximas de renomados sábios egípcios como Ptah Hotep,19 a instituição do monoteísmo solar por Akhenaton e a sua queda sob Tutancâmon, e a ampla variedade de obras sacerdotais que estariam incluídas na educação de alguém pertencente à casa real. Não há nada particularmente incomum na ideia de um semita ocidental sendo criado nos círculos da corte no Egito antigo. Durante o período do Novo Reino, os faraós tinham diversas residências na região do Delta, e os filhos das concubinas eram educados nos hanms reais para liderança no estado. Existem claras evidências de que, pelo menos a partir da época de Ramsés II, os asiáticos eram criados nos hanms do faraó, almejando assumir vários cargos. Na realidade, a influência semita oriental tinha penetrado tão profundamente na corte de Ramsés II, que a sua filha mais velha era chamada pelo nome puramente semita de Bint-Anath.

Esses contatos que Moisés tinha com os semitas que viviam a leste do que na atualidade é o Canal de Suez, levaram ao seu casamento com a filha de um sacerdote midianita, e enquanto ele vivia nesta região, ao sul do mar Morto, recebeu uma manifestação Divina, na qual Deus lhe apareceu usando o nome de Jeová. Moisés recebeu a ordem de retornar ao Egito com seu irmão Arão, e foi encarregado de liderar os israelitas na saída para um destino definitivo na Palestina. A chegada de Moisés ao Egito como líder dos israelitas cativos, coincidiu com o período da maior opressão deste povo. Moisés estava um pouco relutante em assumir as responsabilidades do seu chamado, mas depois de encontrar-se com seu irmão Arão e os anciãos de Israel (Ex 4.27-31), foi ter com Faraó para pedir permissão para que os israelitas saíssem ao deserto para celebrar uma festa para o seu Deus. Este pedido foi negado por Faraó, porque iria incentivar a ociosidade entre os hebreus, não porque houvesse alguma coisa incomum em tal proposta. Ostracos egípcios que registravam as atividades diárias dos operários frequentemente incluíam anotações sobre as suas ausências, e um destes textos fala sobre os operários fazendo “ofertas ao seu deus”.

Em consequência desta recusa a Moisés, uma sequência de calamidades naturais, intimamente relacionadas, caiu sobre os egípcios, culminando com a morte de seus primogênitos. Neste ponto, os israelitas se prepararam para deixar a terra, e foi instituída a festa da Páscoa (Ex 13) para comemorar a Divina libertação do Egito. Os israelitas iniciaram seu Êxodo, dirigindo-se ao sudeste, de Ramessés a Sucote, mas foram impedidos de tomar a rota norte, ao longo do Mediterrâneo, por causa do perigo que os filisteus representavam. Era um povo marítimo que tinha migrado do Egeu para Canaã pouco antes do século XII a.C. Tendo se desviado, entrando no deserto de Etã, os israelitas receberam instruções de acampar perto de Pi-Hairote, entre Migdol e o mar (Ex 14.1). Foi neste acampamento que os carros egípcios alcançaram os israelitas em fuga, precipitando, desta maneira, os eventos que resultaram no Êxodo propriamente dito, e na destruição das forças egípcias. Antes da descoberta de Ramessés, o relato bíblico do Êxodo era visto com considerável ceticismo por muitos estudiosos, dos quais alguns declaravam que a verdadeira rota seguida era a estrada militar de Ramessés a Gaza, conhecida como o “Caminho da terra dos filisteus”. Outros argumentavam que era improvável que os israelitas tivessem realmente cruzado o corpo das águas do mar Vermelho, e sugeriam que, na verdade, eles teriam seguido a antiga rota comercial, que ligava Mênfis a Eziom-Geber, na nascente do Golfo de Acaba. Alguns entendem que parte da interpretação equivocada se deva à tradução do nome hebreu Yatn Suph como sendo “mar Vermelho”, e que a tradução correta seria “mar de Pântano”, ou “mar de juncos”. Assim, este grupo de estudiosos entende que os nomes “mar Vermelho” (Ex 13.18), e “o mar” (Ex 14) provavelmente pretendem indicar o Lago de Juncos, situado nos pântanos entre os Lagos Salgados e a cidade de Zilu (Thiel). Eles entendem como pouco provável que a referência seja ao golfo oceânico, que se estende do Oceano Indico ao Golfo de Suez, pois ali não havia juncos. Embora o nome Iam Suh fosse usado, na antiguidade, livremente, para designar o mar Vermelho propriamente dito, e também os golfos de Suez e Acaba, este grupo pensa que parece improvável que qualquer um dos dois últimos fosse o Yam Suph da narrativa do Êxodo. A principal razão é que os israelitas são retratados como cruzando um volume de água que representava um obstáculo natural para a viagem no deserto do Sinai, e nem o Golfo de Suez nem o de Acaba satisfazem este requisito. O mar Vermelho está na extremidade sul de uma falha geológica, que se estende desde a Síria, seguindo o vale do Jordão e o Golfo de Acaba, até a África. Na antiguidade, a área norte do Golfo de Suez consistia de uma sucessão de pequenos lagos e terreno pantanoso, onde os juncos para papiros cresciam em abundância. Documentos egípcios do século XIII a.G. falavam de um grande Pântano de Papiro, que existia na localidade de Tânis, no delta do Nilo.’ Assim, alguns entendem que a travessia foi feita provavelmente na área do Lago Timsah, um corpo de água um pouco ao norte dos Lagos Salgados. Porém isto não é possível, pois ali há trechos rasos de água que seriam facilmente abertos por um vento, e que não afogariam o exército egípcio. A descrição de Êxodo 14.21 mostra um milagre e não um fenômeno natural que pode ocorrer periodicamente em diferentes partes do mundo. Assim podemos entender que a travessia realmente se deu no mar Vermelho.

——- Retirado de R. K. Harrison – Tempos do Antigo Testamento.


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