Os Tesouros dos Deuses

I

A esposa de Thor era a bela Sif, uma Aesir. Thor a amava por ser quem ela era, mas também por seus olhos azuis, sua pele alva, seus lábios vermelhos e seu sorriso, e ele amava seus longos, longuíssimos cabelos, que eram da cor de um campo de cevada no m do verão.

Thor acordou e encarou Sif, que ainda dormia. Ele coçou a barba. Em seguida, cutucou a esposa com a mão enorme.

— O que aconteceu? — perguntou o deus.

Sif abriu os olhos. Eles eram da cor do céu no verão.

— O que aconteceu com o quê? — perguntou ela, e então mexeu a cabeça.

Sif estava confusa. Ergueu os dedos, intrigada, tocando o couro cabeludo careca e rosado. Depois olhou para Thor, horrorizada.

— Meu cabelo…

Thor assentiu.

— Sumiu — constatou o deus.

— Ele deixou você careca. — Ele? Ele quem? — perguntou Sif.

Thor não respondeu. Atou Megingjord, seu cinturão de poder, que dobrava sua enorme força.

— Loki — explicou. — Isso é obra de Loki.

— Como pode ter tanta certeza? — indagou Sif, passando a mão pela cabeça careca compulsivamente, como se o toque delicado de seus dedos fosse fazer o cabelo voltar a crescer.

— Porque, sempre que alguma coisa estranha acontece, penso logo que é culpa de Loki. Poupa muito tempo — explicou o deus.

A porta dos aposentos de Loki estava trancada, então Thor a botou abaixo, explodindo-a em pedacinhos. Ele ergueu Loki pelo pescoço e perguntou, simplesmente:

— Por quê?

— Por que o quê? — Loki era a face da mais perfeita inocência.

— O cabelo de Sif. O cabelo dourado de minha esposa. Era tão bonito… Por que você o cortou?

Cem expressões diferentes misturaram-se no rosto de Loki — em sua face havia um ar astuto e enganador, truculento e confuso, tudo ao mesmo tempo. Thor o sacudiu com força. Loki olhou para baixo, se esforçando ao máximo para parecer envergonhado.

— Achei que seria engraçado. Eu estava bêbado.

Thor franziu a testa.

— O cabelo era a glória de Sif. Vão pensar que raspei a cabeça dela como castigo. Que ela fez o que não devia com quem não devia.

— Bem, é verdade. É mesmo — respondeu Loki. — É provável que pensem isso. E, bem, infelizmente, considerando que arranquei o cabelo pela raiz, ela vai passar o resto da vida completamente careca…

— Ah, não vai, não. — Thor encarou Loki, erguendo-o bem acima da cabeça, com uma carranca trovejante.

— Bem, temo que vá, sim. Mas Sif pode usar chapéus, lenços…

— Ela não vai passar o resto da vida careca — interrompeu Thor. — Porque se você, Loki, filho de Laufey, não fizer o cabelo dela crescer agora mesmo, vou quebrar cada osso do seu corpo. Todos, um por um. E se o cabelo não crescer direito, vou voltar e quebrar todos os seus ossos outra vez. E de novo. Se eu praticar todos os dias, em pouco tempo carei muito bom nisso — comentou ele, soando um pouco mais animado.

— Não! — pediu Loki. — Não tenho como devolver o cabelo. Não é assim que funciona.

— Acho que hoje vou levar uma hora para quebrar todos os ossos do seu corpo — refletiu Thor. — Mas aposto que, com prática, consigo reduzir esse tempo para quinze minutos. Vai ser bem interessante descobrir.

E Thor quebrou o primeiro osso.

— Anões! — gritou Loki.

— Como?

— Os anões! Eles conseguem fazer qualquer coisa. Vão criar um cabelo dourado para Sif, um cabelo que vá se unir com a cabeça e crescer normalmente, os dourados perfeitos. Eles podem fazer isso. Juro.

— Então é melhor você se apressar — sugeriu Thor, largando Loki no chão.

Loki se levantou meio sem jeito e saiu correndo antes que Thor pudesse quebrar mais algum osso seu.

Ele calçou os sapatos que lhe permitiam viajar pelos céus e foi para Svartalfheim, onde ficam as ocinas dos anões. Constatou que os mais engenhosos eram três anões conhecidos como os filhos de Ivaldi.

Loki foi até a forja subterrânea dos três anões.

— Saudações, filhos de Ivaldi. Ouvi dizer nas minhas andanças que Brokk e seu irmão Eitri são os melhores artesãos anões deste tempo e de todos os outros — comentou Loki.

— Não é verdade — retrucou um dos filhos de Ivaldi. — Nós é que somos. Nós somos os maiores artesãos que existem.

— Mas me garantiram que Brokk e Eitri sabem forjar tesouros tão bons quanto os de vocês.

— Mentiras! — exclamou o mais alto dos filhos de Ivaldi. — Eu não confiaria naqueles incompetentes de mãos furadas nem para ferrar um cavalo.

O menor e mais sábio dos filhos de Ivaldi apenas deu de ombros.

— Não importa o que eles fazem, nós conseguimos fazer melhor.

— Soube que eles desaaram vocês a produzir três tesouros — comentou Loki. — Os deuses Aesir vão julgar quem é o melhor forjador. Ah, por falar nisso, um desses tesouros tem que ser cabelo. Cabelo dourado, do tipo que nunca para de crescer.

— Nós podemos fazer isso — respondeu um dos filhos de Ivaldi.

Até mesmo Loki tinha dificuldade de diferenciá-los.

O deus da trapaça atravessou a montanha para visitar o anão chamado Brokk na oficina que ele compartilhava com o irmão, Eitri.

— Os filhos de Ivaldi estão forjando três tesouros para presentear os deuses de Asgard — anunciou Loki. — Os deuses vão julgar quais são os melhores. E os filhos de Ivaldi me pediram para lhes trazer uma mensagem: os três estão confiantes de que você e seu irmão não conseguem forjar nenhum tesouro tão bom quanto os deles. Chamaram vocês de “incompetentes de mãos furadas”.

Brokk não era tolo.

— Isso não está me cheirando bem — disse o anão. — Tem certeza de que não é uma das suas tramoias? Criar um confiito entre os filhos de Ivaldi e nós parece o tipo de coisa que você faria.

Loki fez a expressão mais sincera de que era capaz, que era impressionantemente sincera.

— Isso não tem nada a ver comigo — declarou, em tom inocente. — Só achei que vocês deveriam saber.

— E não vai ganhar nada com essa disputa? — perguntou Brokk.

— Nada mesmo.

Brokk assentiu e olhou para Loki. O irmão de Brokk, Eitri, é que era o grande artesão, mas Brokk era o mais inteligente e o mais determinado.

— Bem, então ficaremos muito felizes em enfrentar os filhos de Ivaldi em um teste de habilidade a ser julgado pelos deuses. Eu não tenho dúvida de que Eitri consegue forjar tesouros melhores e mais complexos do que os filhos de Ivaldi. Mas que tal uma aposta?

— No que você está pensando? — perguntou Loki.

— Quero a sua cabeça em troca dos tesouros — declarou Brokk. — Se ganharmos o desafio, meu irmão e eu ficaremos com ela. Tem muita coisa acontecendo nessa sua cabeça, Loki, e tenho certeza de que Eitri poderia transformá-la em um dispositivo maravilhoso. Uma máquina de pensar, talvez. Ou um tinteiro. O sorriso de Loki não vacilou, mas ele fechou a cara por dentro. O dia tinha começado tão bem… Ora, seria apenas uma questão de garantir que Eitri e Brokk perdessem o concurso. Os deuses ainda receberiam as seis maravilhas dos anões, e Sif recuperaria seu cabelo dourado. Ele podia fazer isso. Era Loki, afinal.

— É claro — concordou o deus. — Minha cabeça. Sem problema.

Do outro lado da montanha, os filhos de Ivaldi forjavam seus tesouros. Loki não estava preocupado com eles. Mas precisava garantir que Brokk e Eitri não conseguiriam — na verdade, nem poderiam — vencer a disputa. Brokk e Eitri entraram na forja. O interior estava escuro, iluminado apenas pelo brilho laranja do carvão em brasa. Eitri pegou um pedaço de couro de porco de uma prateleira e jogou na forja.

— Estava guardando esse couro para uma situação como essa — comentou o anão.

Brokk apenas assentiu.

— Muito bem — começou Eitri. — Você fica no fole, Brokk. Não pare de bombear. Preciso que a forja que bem quente, e preciso que a temperatura seja constante, ou não vai funcionar. Bombeie. Bombeie sem parar.

Brokk começou a bombear o fole, enviando um uxo de ar rico em oxigênio bem para o coração da forja, aquecendo tudo. Já tinha feito aquilo muitas vezes. Eitri ficou olhando até se dar por satisfeito, convencido de que tudo estaria a seu gosto. O anão saiu para trabalhar em sua criação do lado de fora da forja. Quando abriu a porta para sair, um inseto grande e preto entrou voando. Não era nem uma mutuca nem uma mosca varejeira, era ainda maior. O inseto entrou voando, circulando a forja com malícia. Brokk ouvia os martelos de Eitri do lado de fora, ouvia o irmão limando, torcendo, moldando e martelando. A enorme mosca preta — a maior e mais preta que já se viu — pousou na mão de Brokk. As mãos do anão estavam no fole. Ele não parou de bombear para espantar o inseto. A mosca deu uma picada dolorida nas costas de sua mão. Brokk não parou de bombear. A porta se abriu. Eitri entrou e retirou o trabalho da forja com todo o cuidado. Ao que parecia, era um enorme javali com pelo de ouro reluzente.

— Bom trabalho — elogiou Eitri. — Se estivesse só um grau mais quente ou mais frio, isso tudo teria sido um desperdício de tempo.

— Você também fez um bom trabalho, irmão — comentou Brokk.

A mosca preta, lá no teto da oficina, fervilhava de raiva e ressentimento. Eitri pegou um bloco de ouro e jogou na forja.

— Muito bem — falou —, este tesouro vai deixar os deuses impressionados. Quando eu disser, comece a bombear o fole. Então, aconteça o que acontecer, não reduza o ritmo, não acelere nem pare. É um trabalho delicado.

— Pode deixar — respondeu Brokk.

Eitri saiu da sala e começou a trabalhar. Brokk esperou até ouvir o comando do irmão, e então começou a bombear o fole. A mosca negra voou pelo aposento, pensativa, então pousou no pescoço de Brokk. O inseto desviou-se com delicadeza de um filete de suor; o ar estava quente e abafado na forja. Então picou o pescoço de Brokk com toda a força. Sangue escarlate escorreu junto ao suor no pescoço do anão, mas ele não parou de bombear. Eitri voltou. Tirou da forja um bracelete em brasa, branco de tão quente. Jogou-o no poço de resfriamento feito de pedra. Uma nuvem de vapor se elevou quando o bracelete afundou na água. Ele foi esfriando, passando depressa para laranja, depois para vermelho em brasa e, por m, para dourado.

— Vou chamá-lo de Draupnir — anunciou Eitri.

— Gotejante? Que nome engraçado para um bracelete — comentou Brokk.

— Não no caso deste — retrucou seu irmão, e explicou a Brokk o que havia de tão especial naquela criação.

— Agora — começou Eitri —, tem uma coisa que venho pensando em fazer faz muito tempo. Minha obra-prima. Mas vai ser ainda mais complicado que os outros tesouros. Então, o que você precisa fazer é…

— Bombear sem parar? — sugeriu Brokk.

— Isso mesmo. Ainda mais que antes. Não altere o ritmo, ou o trabalho todo será arruinado.

Eitri pegou um lingote de ferro-gusa maior que qualquer lingote que a mosca negra (que na verdade era Loki) tinha visto e o carregou até a forja. Eitri saiu e, aos gritos, ordenou que o irmão começasse a bombear. Brokk bombeou, e os martelos de Eitri soaram conforme o anão puxava, moldava, soldava e unia. Loki, em sua forma de mosca, decidiu que não havia mais tempo para sutilezas. A obra-prima de Eitri impressionaria os deuses de Asgard, e ele perderia a cabeça se eles cassem impressionados o suficiente. Loki pousou entre os olhos de Brokk e começou a picar suas pálpebras. O anão continuou bombeando, os olhos ardendo. Loki picou mais fundo, com mais força, cada vez mais desesperado. Sangue corria das pálpebras do anão, entrando nos olhos, escorrendo pelo rosto, deixando-o cego.

Brokk apertou os olhos e balançou a cabeça, tentando se livrar da mosca. Virou a cabeça de um lado para outro. Contorceu a boca, tentando soprar a mosca para longe. Não adiantou. A mosca continuava picando, e o anão só conseguia ver sangue. Uma dor lancinante tomava sua cabeça. Brokk se preparou e, no m do movimento, rapidamente retirou uma das mãos dos foles e tentou acertar a mosca. Foi um golpe tão rápido e tão forte que Loki mal escapou com vida. O anão pegou outra vez o fole e continuou bombeando.

— Chega! — exclamou Eitri.

A mosca negra voou pelo aposento, trôpega. Eitri abriu a porta, o que permitiu que o inseto escapasse. O anão olhou para o irmão, desapontado. O rosto de Brokk estava coberto de suor e sangue.

— Não sei o que estava acontecendo naquela hora — comentou Eitri. — Mas quase estragou tudo. No m, a temperatura ia e vinha. Por isso não ficou nem de perto tão impressionante quanto eu esperava. Teremos que esperar para ver.

Loki, na forma de Loki, entrou pela porta aberta.

— Então, tudo pronto para o desao? — perguntou.

— Brokk vai a Asgard apresentar meus tesouros aos deuses e cortar sua cabeça — respondeu Eitri. — Prero car aqui na forja, trabalhando.

Brokk encarou Loki por trás das pálpebras inchadas.

— Mal posso esperar para cortar sua cabeça — disse o anão. — Agora é pessoal.

II

Em Asgard, três deuses estavam sentados em seus tronos: Odin, o caolho, o Pai de Todos; Thor, dos trovões, com sua barba ruiva; e o belo Frey, da colheita do verão. Eles seriam os juízes. Loki estava de pé diante deles, ao lado dos três filhos de Ivaldi, que eram praticamente idênticos. Brokk, o anão taciturno de barba negra, estava sozinho, um pouco afastado, carregando as coisas que trouxera escondidas sob panos.

— Muito bem — disse Odin. — O que estamos julgando aqui?

— Tesouros — explicou Loki. — Os filhos de Ivaldi forjaram presentes para você, grande Odin, e para Thor e Frey, e Eitri e Brokk também forjaram presentes. Cabe a vocês decidir qual é o melhor dos seis tesouros. Eu mesmo apresentarei os tesouros forjados pelos filhos de Ivaldi.

Loki presenteou Odin com a lança chamada Gungnir, cuja haste era entalhada com belas runas intricadas.

— A lança pode penetrar qualquer coisa, e, quando jogada, sempre acerta o alvo — explicou Loki. Odin tinha apenas um olho, afinal, e sua pontaria nem sempre era perfeita. — Além disso, há outro aspecto igualmente importante: todo juramento feito sobre esta lança é inquebrável.

Odin ergueu a lança e disse apenas:
— Parece muito boa.

— E aqui… — continuou Loki, orgulhoso — está uma peruca de os dourados. É feita de ouro de verdade. Vai se grudar à cabeça de quem usá-la, e vai crescer e se comportar como cabelo de verdade em todos os aspectos. Cem mil os de ouro.

— Vamos testá-la — anunciou Thor. — Sif, venha aqui.

Sif se levantou e caminhou até os tronos, a cabeça coberta. Ela removeu o lenço. Os deuses levaram um susto quando viram o couro cabeludo careca, nu e rosado. A deusa pôs a peruca dourada dos anões com cuidado na cabeça e balançou o cabelo. Todos observaram enquanto a base da peruca se unia ao couro cabeludo, e então Sif se postou à frente dos deuses, mais bela e radiante do que nunca.

— Impressionante — comentou Thor. — Um ótimo trabalho!

Sif balançou o cabelo dourado e saiu do salão, banhando-se na luz do sol, querendo exibir o novo cabelo às amigas. O último dos presentes impressionantes forjados pelos filhos de Ivaldi era pequeno, e dobrado como tecido. Loki pegou o tecido e o pôs diante de Frey.

— O que é isso? Parece um lenço de seda — comentou Frey, não achando aquilo nem um pouco impressionante.

— É verdade — concordou Loki. — Mas, se desdobrá-lo, verá que na verdade é um navio. Seu nome é Skidbladnir. Sempre terá bons ventos, não importa aonde for, e, mesmo sendo enorme, o maior barco que se possa imaginar, ele se dobra como um lenço e pode ser guardado no bolso.

Frey estava impressionado, e Loki ficou aliviado. Eram três presentes excelentes. Era a vez de Brokk. Suas pálpebras estavam vermelhas e inchadas, e havia a marca de uma grande picada de inseto em seu pescoço. Loki achou que Brokk parecia confiante demais, ainda mais considerando os presentes impressionantes que os filhos de Ivaldi tinham forjado. Brokk pegou o bracelete de ouro e o colocou diante de Odin, em seu grande trono.

— Este bracelete se chama Draupnir — explicou o anão. — Porque, a cada nove noites, oito braceletes de mesma beleza cairão dele como gotas. Podem ser usados para recompensar alguém, ou guardados para aumentar sua riqueza.

Odin examinou o bracelete, em seguida o enou no braço e empurrou até o bíceps. A joia reluzia.

— Parece muito bom — comentou.

Loki lembrou que Odin dissera o mesmo a respeito da lança.

Brokk agora se dirigiu a Frey. Ergueu o pano, revelando um enorme javali com pelos dourados.

— Este é um javali que meu irmão fez para você, Lorde Frey, para puxar sua carruagem — explicou Brokk. — Ele consegue correr pelo céu e sobre o mar mais rápido que o cavalo mais veloz. Seu pelo dourado iluminará até a noite mais escura, permitindo que você veja o caminho. Ele nunca se cansa, nem nunca falhará. Seu nome é Gullinbursti, o dos pelos de ouro.

Frey pareceu impressionado. Ainda assim, pensou Loki, o navio mágico que se dobrava como um lenço era tão impressionante quanto um javali que nunca se cansava e brilhava no escuro. Sua cabeça estava bem segura sobre os ombros. E o último presente que Brokk apresentaria era aquele que Loki sabia que havia conseguido sabotar. De debaixo do pano, Brokk tirou um martelo, colocando-o diante de Thor. Thor olhou para o martelo e resmungou:

— O cabo é muito curto.

Brokk assentiu.

— É mesmo. Foi culpa minha. Eu estava trabalhando no fole. Mas, antes de dispensá-lo, ouça o que tenho a dizer sobre o que torna este martelo especial. Seu nome é Mjölnir, o forjador de raios. Sua principal característica é ser inquebrável. Não importa a força com que você, lorde Thor, o bata em qualquer coisa, o martelo sempre sairá ileso.

Thor pareceu interessado. Já quebrara muitas armas ao longo dos anos, em geral quando acertava coisas com elas.

— Quando arremessado, o martelo nunca erra o alvo.

O deus do trovão pareceu ainda mais interessado. Tinha perdido muitas armas excelentes atirando-as em coisas que o irritavam e errando, e vira muitas outras que arremessara desaparecerem ao longe, para nunca mais serem vistas.

— Não importa quão forte ou quão longe o martelo seja jogado: ele sempre voltará para as suas mãos.

Thor abriu um sorriso. E o deus do trovão não sorria com frequência.

— É possível alterar o tamanho do martelo. Ele cresce e encolhe, e fica tão pequeno que, se quiser, dá para escondê-lo na roupa.

Thor bateu palmas, satisfeito, e um trovão ecoou por Asgard.

— Apesar disso, como já notou, o cabo é curto demais — concluiu Brokk, tristonho. — Isso é culpa minha. Não consegui manter o fole soprando enquanto meu irmão, Eitri, o forjava.

— O tamanho do cabo é um detalhe, um defeito estético — retrucou Thor. — Este martelo vai nos proteger dos gigantes do gelo. É o melhor presente que já vi.

— O martelo vai proteger Asgard. Vai proteger a todos nós — concordou Odin, satisfeito.

— Se eu fosse um gigante, caria com muito medo de Thor usando esse martelo — acrescentou Frey.

— Sim, é um martelo excelente. Mas, Thor, e o cabelo? A bela cabeleira nova de Sif? — perguntou Loki, mostrando sinais de desespero.

— O quê? Ah, sim. O cabelo de minha esposa é muito bonito — concordou Thor. — Brokk, mostre-me como fazer o martelo aumentar e encolher.

— O martelo de Thor é ainda melhor que minha maravilhosa lança e meu excelente bracelete — comentou Odin, assentindo.

— O martelo é melhor e mais impressionante do que meu navio e meu javali — admitiu Frey. — Vai manter os deuses de Asgard em segurança.

Os deuses deram tapinhas nas costas de Brokk e lhe disseram que ele e Eitri tinham forjado o melhor presente que eles já haviam recebido.

— Bom saber — respondeu Brokk, agora se dirigindo a Loki. — Então posso cortar sua cabeça, filho de Laufey, e levá-la comigo. Eitri vai ficar muito feliz. Podemos transformá-la em alguma coisa útil.

— Eu… pago para ter minha cabeça de volta — ofereceu Loki. — Tenho tesouros que posso oferecer em troca.

— Meu irmão e eu já temos todos os tesouros de que precisamos — retrucou Brokk. — Nós forjamos tesouros. Não, Loki, eu quero a sua cabeça.

Loki pensou por um momento, então disse:

— Pode ficar com ela, se conseguir me alcançar! — Ele saltou para o ar e saiu correndo, passando por cima de todos. Em instantes, tinha desaparecido.

Brokk olhou para Thor.

— Pode pegá-lo?

O deus deu de ombros.

— De certo, eu não deveria. Mas a verdade é que eu adoraria testar este martelo.

Em instantes, Thor voltou segurando o deus da trapaça com força. Loki o encarava impotente e furioso. Brokk sacou a faca.

— Venha cá, Loki — chamou. — Vou cortar sua cabeça.

— É claro — concordou Loki. — Você pode cortar minha cabeça, lógico. Mas vou apelar para o poderoso Odin, dizendo o seguinte: se você cortar qualquer parte do meu pescoço, estará violando os termos do acordo, que prometia minha cabeça a você, e apenas a cabeça.

Odin inclinou a cabeça.

— Loki tem razão — admitiu. — Você não tem o direito de cortar o pescoço dele.

Brokk ficou irritado.

— Mas não posso arrancar a cabeça sem cortar o pescoço — alegou.

Loki parecia muito satisfeito.

— Veja bem… Se as pessoas refletissem mais sobre a exatidão de suas palavras, não ousariam enfrentar Loki, o mais sábio, mais esperto, mais trapaceiro, mais inteligente, mais bonito…

Brokk sussurrou uma sugestão para Odin.

— Isso seria justo — concordou o Pai de Todos.

O anão pegou uma tira de couro e uma faca. Ele envolveu o couro em torno da boca de Loki. Então tentou perfurar o couro com a ponta da faca.

— Não está funcionando — reclamou o anão. — Minha faca não corta sua pele.

— Quem sabe eu tenha sabiamente arranjado uma proteção contra lâminas de faca — sugeriu Loki, com certa modéstia. — Só para o caso de esse truque do “ah, você não pode cortar o meu pescoço” não funcionar. Infelizmente nenhuma faca pode me cortar!

Brokk grunhiu e pegou uma sovela, uma ferramenta pontuda usada para fazer peças de couro, então a enfiou pela tira de couro, abrindo furos nos lábios de Loki. Depois pegou um o grosso e costurou a boca do deus. Brokk foi embora, deixando Loki com a boca costurada bem firme, sem poder reclamar. Para Loki, a dor de não poder falar era mais agoniante do que a dor de ter os lábios costurados no couro.

E agora você sabe: foi assim que os deuses ganharam seus maiores tesouros. Foi por causa de Loki. Até o martelo de Thor foi culpa de Loki. Com ele, era assim: havia ressentimento até mesmo junto à maior gratidão, e havia gratidão mesmo no momento em que ele era mais odiado.

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