O Retorno e a Restauração de Israel
A GRANDE RIQUEZA E PROSPERIDADE DO NOVO IMPÉRIO BABII.ONICO continuou durante todo o reinado de Nabucodonosor II. A sua orgulhosa ostentação, como registrado em Daniel 4.30, estava certamente cm conformidade com seus ambiciosos projetos de construção. Seus interesses também se estenderam para as velhas cidades sumérias, e em Ur, restaurou o vasto complexo do templo de Nanna, remodelando-o e elevando o nível do pátio externo. Essa obra parece ter sido empreendida no espírito da reforma religiosa, que coloca o relato da adoração da imagem, registrada em Daniel 3.1 e versículos seguintes, em uma nova perspectiva. Woollev descobriu que as câmaras que as “hierodules” sagradas e as sacerdotisas haviam ocupado nas proximidades do santuário, foram completamente removidas durante a restauração. Um espaço havia sido desocupado em frente ao santuário, e um altar foi ali colocado, proporcionando plena visão aos adoradores, desse modo poderiam m observar o sacerdote enquanto ele fazia suas ofertas em público, sobre o altar.
Este consistia em um nítido abandono dos métodos anteriores, uma vez que os atos rituais do ministrante eram secretos e conhecidos apenas da classe sacerdotal. Parece claro que Nabucodonosor havia iniciado um programa de reformas religiosas que procurava modificar os antigos rituais marcados pela sensualidade, e permitir ao público adorador participar como grupo nas ofertas sacrificiais. Essa reforma do ritual é refletida no terceiro capítulo de Daniel, que registrou um decreto que ordenava que a população adorasse uma imagem do rei. Esse monumento havia sido erigido no campo de Dura, e todos tinham pleno acesso a ele. Como comenta Woolley:
O que havia de novo no ato do rei? Não era a construção de uma estátua, porque cada rei, um após outro, havia feito o mesmo; a novidade era a ordem para uma adoração geral por parte do público: o rei estava substituindo um ritual realizado por sacerdotes por uma forma de adoração congregacional que todos os seus súditos eram obrigados a assistir.
A Doença de Nabucodonosor
Como era de se esperar, registros históricos babilônios contemporâneos não fizeram nenhuma menção à doença mental que, de acordo com o livro de Daniel (4.16 e versículos seguintes), acometeu Nabucodonosor perto do final de sua vida. A doença em questão, que era uma forma rara de monomania conhecida como boantropia, deve ter sido uma fonte de perplexidade e embaraço para os círculos oficiais. Somente depois de três séculos um sacerdote babilônio, de nome Berossus, registrou uma tradição que dizia que Nabucodonosor ficou subitamente doente perto do final de seu reinado. Eusébio (no quarto século d.C.) citou uma versão diferente, que relatava que o rei repentinamente desapareceu depois de vaticinar a queda de seu império. Essa tradição parece ser um reflexo deturpado da narrativa de Daniel (4.31), e pode ter sido preservada dessa forma para ocultar a presença da loucura, que causava temor e espanto universal na antiguidade.
O Declínio do Poder Babilônico
Quando Nabucodonosor morreu em 562 a.C, foi sucedido por seu filho AmelMarduque, chamado Evil-Merodaque em 2 Reis 25.27. Com sua ascensão, o poder do império entrou em declínio, e depois de dois anos, ele foi assassinado por seu cunhado, Neriglisar, que reinou por quatro anos. Em 556 a.C. seu filho ocupou o trono durante alguns meses, mas também foi morto em uma conspiração, e um de seus assassinos, Nabonido, o sucedeu. Ele reinou até 539 a.C, e foi o último monarca do Novo Império Babilônico. Era um homem de cultura considerável, particularmente interessado em atividades arqueológicas. Enviava seus escribas por toda a Mesopotâmia para coletar inscrições antigas das mais diferentes fontes, e ordenou que nomes e datas relativas a reis fossem compilados. Há motivo, de certa forma, para se pensar que sua mãe fora uma sacerdotisa no templo do deus da lua em Harã, e isto pode ter influenciado Nabonido a se tornar um antiquário religioso. Ele foi o último governante babilônico a empreender reparos no zigurate da deidade lunar em Ur, e quando sua restauração estava concluída, estabeleceu a sua filha como sumo-sacerdotisa.’ Ela aparentemente recolheu um certo número de artefatos de um período anterior, e manteve um pequeno museu de antiguidades locais, parte das quais foi descoberta por Woolley.
Durante a maior parte de seu reinado Nabonido dividiu o governo do império com seu filho mais velho Belsazar, a quem, em 553 a.C, entregou a maior parte de sua autoridade real antes de iniciar uma campanha contra Teima, na Arábia. Após conquistar a cidade, construiu sua residência ali e, de acordo com a Crônica de Nabonido, erigiu edifícios suntuosos, comparáveis aos existentes na Babilônia. Nabonido viveu na Arábia por alguns anos, tempo durante o qual Belsazar foi o único governante da Babilônia. Por esse motivo, o segundo foi retratado no livro de Daniel (5.30) como o último rei da Babilônia. A referência a Belsazar, em Daniel 5.18, como filho de Nabucodonosor, também está correta, de acordo com a prática semita, a qual, especialmente no que se referia à realeza, estava mais interessada na sucessão do que na verdadeira descendência direta dos indivíduos. Nitocris, a mãe de Belsazar, era, ao que parece, 61ha de Nabucodonosor,8 e como os semitas em geral utilizavam os termos “filho” e “neto” de forma intercambiável, seria correto falar de Belsazar como “filho” de Nabucodonosor.
A Ascensão de Ciro
O poder declinante do Novo império Babilônico incentivou a ascensão de um enérgico governante persa, Ciro II, que sucedeu o seu pai Cambises I por volta de 559 a.C, como governante de Anshan. Ele rapidamente uniu o povo de seu estado vassalo da Média, e em 549 a.C. revoltou-se contra Astyages, seu suserano. Após um curto período, ele o derrotou em batalha, e dessa maneira, Ciro tornou-se herdeiro do império medo-persa. Seu poder potencial era tão grande, que uma aliança contra ele foi rapidamente formada. Os que tomaram parte foram Creso, rei da Lídia (Ásia Menor), um rei incrivelmente rico a quem é creditada a invenção da cunhagem; Nabonido da Babilônia, e Amasis, o faraó do Egito (de aproximadamente 569-525 a.C). Em 546 a.C, Ciro atacou as forças de Creso, derrotando-as, ganhando dessa forma o controle de toda a Ásia Menor. Sua próxima investida foi contra a própria Babilônia, e o cilindro de Ciro registrou o modo pelo qual Marduque, a divindade protetora, o ajudou na vitória subsequente:
Marduque… fez com que ele seguisse para a sua cidade, Babilônia… fez com que tomasse a estrada para a Babilônia, indo como amigo e companheiro ao seu lado… sem luta e sem conflito, permitiu que ele entrasse na Babilônia. Ele poupou a sua cidade, Babilônia, de sofrer algum tipo de calamidade…
Foi dito que Ciro alterou o curso do rio Eufrates em seu ataque à cidade principal, de forma que seus soldados entraram na Babilônia avançando pelo leito do rio. Em todo caso, a Babilônia caiu sob as forças persas em 538 a.C. e o exército caldeu, sob o comando de Belsazar, foi derrotado. Com a conquista da Babilônia, Ciro tornou-se o governante do maior império que o mundo já conhecera, e durante o reinado de seu filho, a influência da Pérsia estendeu-se para oeste até o Egito. Ciro considerava a queda da Babilônia como uma repreensão a Nabonido por seu desprezo e negligência em relação a Marduque, e a sua ação injustificável ao levar para a Babilônia todas as estátuas dos deuses, quando as forças persas estavam invadindo o reino. Porém, para os judeus exilados, a queda da orgulhosa Babilônia era o princípio de sua própria reabilitação, e eles consideraram Ciro como o libertador designado por Deus, que os libertaria e permitiria que retornassem à terra de seus pais.
O Édito de Ciro e o Retorno
Tal expectativa não era infundada, pois imediatamente após a conquista da Babilônia, Ciro ordenou que todas as estátuas que Nabonido havia trazido para a capital, fossem devolvidas às suas cidades de origem. Isto foi seguido por um ato de clemência para com todos os prisioneiros na Babilônia que, embora fosse por natureza, humanitário, era também um astuto movimento político. O cilindro de Ciro registrou o édito que o novo governante proclamou em 538 a.C, assegurando a liberdade aos povos escravizados, permitindo que retornassem à sua terra para retomarem o fio de sua antiga existência:
De… até Assur e Susa, Agade, Ashnunnak, Zamban, Metumu, Deri, com o território do povo de Gutium, as cidades do outro lado do Tigre… os deuses, que nelas habitavam, eu os devolvi às suas regiões… todos os seus habitantes, os reuni e os devolvi a seus locais de habitação…
O registro bíblico da proclamação de Ciro (2 Cr 36.23; Ed 1.2 e versículos seguintes) indicam que os exilados receberam todo incentivo do monarca persa para retornarem a Judá e reconstruírem o Templo em Jerusalém. Ciro devolveu até os vasos de ouro e prata que Nabucodonosor havia levado para a Babilônia, quando Jerusalém sucumbiu aos caldeus, e designou Sesbazar, um membro da família real, como governador de Judá. Essas narrativas refletem o quadro exato da política que Ciro adotava com respeito a todos aqueles que haviam sido expatriados sob o Novo Regime Babilônico. Ao exortar os povos cativos a retornarem para suas terras nativas e reconstruírem seus santuários religiosos, Ciro estava de uma só vez liberando a si mesmo da responsabilidade de mantê-los na servidão e promovendo a boa vontade para com seu próprio regime em todas as partes do seu recém-conquistado império. Porém, mesmo com esta forma de incentivo, muitos dos exilados hebreus estavam relutantes em retornar para a sua desolada terra natal e trabalhar pela reconstrução da vida da nação. Como já foi dito, por este tempo, os judeus de natureza mais materialista haviam adquirido consideráveis interesses patrimoniais na Babilônia, e não tinham a menor vontade de abandonar os confortos da vida estabelecida em troca das incertezas e dificuldades da vida de pioneiros em uma região desolada.
Por volta de 536 a.C. alguns dos primeiros cativos começaram a longa e perigosa jornada de volta para Judá, sob a liderança de Sesbazar e Zorobabel. Eles levaram seus rebanhos e manadas para sua empobrecida terra natal, e ao chegarem em Jerusalém, visitaram o local do Templo, avaliando a situação desoladora. Alguns dos mais proeminentes chefes de famílias contribuíram com quantias em dinheiro para o fundo de restauração do Templo, e Esdras descreveu a doação de ouro em termos de moeda, usando a palavra dracma (que a versão KJV em inglês traz como “dram”). Costumava-se argumentar que a dracma não foi utilizada na Palestina até depois das conquistas de Alexandre o Grande (em aproximadamente 330 a.C), mas sabe-se agora que a crescente influência do império grego contribuiu para a utilização da dracma ateniense como moeda padrão na Palestina, a partir da metade do quinto século a.C.1 No primeiro ano após o retorno, o altar das ofertas queimadas foi reconstruído, e algumas das antigas cerimônias para a devoção pública foram restabelecidas. Fundos para a reconstrução do Templo aumentavam de forma constante, e carpinteiros, pedreiros e outros operários eram empregados para limpar o local e dar início ao trabalho de reconstrução. Assim como nos dias de Salomão, árvores de cedro da região do Líbano foram levadas para Jerusalém, e no segundo ano após o retorno, as fundações do novo Templo foram assentadas, em meio a notáveis cenas de emoção (Ed 3.8 e versículos seguintes).
A Oposição à Reconstrução na Judéia
Mas justamente agora, quando tudo parecia favorecer o rápido término da reconstrução, iniciou-se um espírito de contrariedade por parte do povo que viveu na região durante o exílio. Esses colonos eram descendentes dos mesopotâmios que haviam sido deportados para a Palestina por Sargão, Esar-Hadom e Assurbanipal, mas abrangia majoritariamente aqueles que haviam povoado Samaria quando o reino do norte se desfez. Quando os samaritanos se ofereceram para ajudar no trabalho da construção do Templo, sua oferta íoi rejeitada, provavelmente porque os judeus estavam temerosos de serem mais uma vez corrompidos pela idolatria. Irritados com essa recusa, os samaritanos se afundaram na intriga política com o objetivo de impedir a reconstrução do Templo, e conseguiram uma proibição de Cambises II (530-522 a.C), filho de Ciro, impedindo que maiores progressos fossem realizados. A autêntica natureza da correspondência aramaica em Esdras 4.7 e versículos seguintes foi amplamente demonstrada através dos famosos papiros de Elefantina. Esses documentos foram descobertos em 1903, e consistiam de cartas escritas em aramaico por judeus que viviam em uma colônia militar localizada na ilha de Elefantina, próximo a Assuã, no Alto Egito. Como nos registros bíblicos, os papiros mostram que os reis persas estavam interessados no bem-estar religioso e social de seus súditos.12 Durante o período persa (539-331 a.C), o aramaico tornou-se o idioma do comércio e da diplomacia por todo o império e, gradualmente substituiu o hebraico como a língua falada entre os judeus. Em particular, os papiros mostram que as formas literárias utilizadas por Esdras eram características do quinto século a.C, e que a carta contida no quarto capítulo de seu livro não deve ser datada antes desse período. A ortografia dos nomes da realeza, em Esdras, exibe uma variação com relação ao costume vigente no século quinto a.C. e posteriores, e é provável que as formas bíblicas fossem derivadas de traduções persas anteriores, que foram modificadas a seguir.
Aproximadamente treze anos haviam se passado desde o assentamento das fundações do segundo Templo, quando um período de confusão iniciou-se no império persa. Cambises, que havia incluído o Egito nos imensos domínios da Pérsia ao derrotar Psamético III em Pelusio por volta de 525 a.C, ficou mentalmente doente logo depois, e cometeu suicídio em 522 a.C. Algumas das províncias que haviam sido subjugadas por Ciro, revoltaram-se e tentaram libertar-se do império, porém a ordem foi finalmente restabelecida por um príncipe acadiano, Dario o Grande (522-486 a.C). Enquanto ele estava reconquistando o controle militar, os habitantes de Judá experimentaram alguma independência, e quando Dario restabeleceu o domínio imperial, manteve uma política de tolerância e benevolência para com eles. Incentivou os judeus a completarem o trabalho de reconstrução do Templo em Jerusalém, porém se depararam com mais oposição, em consequência da qual Dario ordenou que se realizasse uma busca pelo decreto original, que autorizava a obra (Ed 6.1 e versículos seguintes). Quando foi encontrado, Dario proibiu interferência adicional contra a reconstrução e providenciou um volumoso subsídio para a conclusão do empreendimento.
——- Retirado de R. K. Harrison – Tempos do Antigo Testamento.
Leia também:
- O Período dos Macabeus
- A Profecia entre os Hebreus
- O Crescimento do Poder Sírio
- O Declínio de Israel
- A Queda de Judá
- A Ascensão da Babilônia
- O Primeiro Cativeiro de Judá
- O Exílio de Judá
- Ascenção e Declínio do Império Persa
- A Ascenção do Judaísmo
[…] O Declínio do Poder Babilônico […]
[…] O Declínio do Poder Babilônico […]
[…] O Declínio do Poder Babilônico […]
[…] O Declínio do Poder Babilônico […]