Titikaca e Huiracocha – Mitologia Ameríndia

( Mito Inca )
Depois que um grande dilúvio cobriu a Terra, tudo era água, escuridão e silêncio. A primeira luz surgiu com o aparecimento de um jaguar de fogo, que se chamava Titi, e vivia tanto na terra quanto na água. Titi subiu a uma alta montanha de pedra e de lá iluminou o mundo; desde então, aquela foi chamada a Rocha do Jaguar, ou Titi-Kaka. Naquela região, formou-se u m lago, que nasceu pois o Deus-avô Khunu havia estendido um manto de gelo sobre os planaltos dos Andes. Desse gelo derretido teve início o enorme lago sagrado consagrado ao jaguar de fogo, e que também se chamou Titikaca. Foi então que apareceu, às margens do lago sagrado, um grande deus que foi chamado Kon Tiki Huira Cocha Pachayachachic. Alguns o chamam de Huiracocha ou Viracocha, outros simplesmente de Criador, e alguns acreditam ser ele o Deus-Sol. Huiracocha queria povoar a terra devastada pelas águas e começou a criar os seres humanos esculpindo pedras e dando-lhes forma de gente. Formou homens, mulheres, crianças, chefes, famílias. Para cada grupo, Huiracocha deu uma denominação, decidiu que ponto do mundo iriam povoar, que línguas falariam e que nome cada criatura teria. Ele colocou os grupos de estátuas de pedra em nascentes, rochedos ou cavernas espalhados por vários lugares; mas todos continuavam imóveis. Depois disso, o Criador trouxe para junto do Titikaca dois filhos, ou ajudantes, que tinham por nomes Tocapa Huiracocha e Imaymana Huiracocha. E lhes disse para irem pelo mundo, a cada um dos lugares para onde ele havia mandado os seres de pedra. Chegando aos locais, Tocapa e Imaymana deveriam chamar as criaturas pelos nomes que lhes tinham sido atribuídos pelo deus. Tudo aconteceu conforme as ordens dadas: assim que eram chamados por seus nomes, os homens e as mulheres de pedra ganhavam a vida. Cada grupo saiu das cavernas, rochedos ou nascentes de rio em que o Criador os colocara, e fundaram então cidades para viver, criar seus filhos e povoar o mundo. Muitos deles receberam instruções dos Huiracochas sobre como trabalhar o solo, como construir casas e como alimentar-se. Agradecidos ao Deus Criador, esses povos consideraram as pedras ou cavernas de onde haviam saído como huacas, ou lugares sagrados. Os dois enviados do deus deveriam também trazer à vida plantas, flores e frutos, o que eles faziam dando nomes a cada uma de suas criações. Precisariam ainda criar animais, machos e fêmeas, ensinar às aves o tipo de canto que cada espécie teria de cantar e designar para cada espécie de animal o local que deveria habitar. Assim eles fizeram, e logo a Terra se encheu de seres viventes. Mas ainda havia escuridão; por isso, para que houvesse luz – além daquela primeira luz do jaguar de fogo – Huiracocha separou o dia da noite e criou o Sol, a Lua e as estrelas.  Ele ordenou aos astros que alcançassem o ponto mais alto da ilha que existe no meio do lago Titikaca, e que de lá subissem ao céu e iluminassem a Terra. No momento em que o Sol nasceu pela primeira vez, o deus chamou uma das raças que criara, a que ele dera o nome de Incas. Esse povo surgiu, pelas ordens do deus, de uma gruta chamada Paccari-Tambo, que depois seria homenageada como o local de origem daquela nação. Huiracocha lhes apareceu em uma forma resplandecente; contou-lhes que era seu criador e que estavam destinados a dominar muitas nações. Dizem que foi nesse dia que o deus entregou ao governante – a quem alguns chamam de Manco Capac – as insígnias reais: o ornamento para a cabeça e o cetro, dois objetos que seriam o símbolo do povo Inca. Depois Huiracocha deixou o Titikaca e foi caminhar pelo mundo, para verificar como os seres que tirara das pedras viviam, e ver se haviam se multiplicado e se cumpriam as determinações dele. Muitos povos honraram seu Criador, mas alguns não o reconheceram. Os povos que não obedeciam a suas ordens eram transformados em pedra, como castigo; as estátuas dessas criaturas estão espalhadas pelas terras visitadas pelo deus. Uma história conta que, ao andar em direção à cidade de Cuzco, ele parou na localidade chamada Cacha e viu os moradores correrem em sua direção brandindo armas para mata-lo. Furioso, Huiracocha ordenou que chovesse fogo sobre eles, a partir do cume de uma montanha. O fogo começou a avançar sobre a cidade, e somente então os homens perceberam que tinham um deus diante de si: prostraram-se a seus pés e lhe pediram que os perdoasse. Com um gesto do Criador, o fogo parou de descer da montanha e os homens se salvaram, mas até hoje é possível ver as encostas queimadas do morro. Os incas se tornaram um grande Império, e os povos criados por Huiracocha construíram muitas huacas para honrar os lugares e os seres sagrados. Dizem que, depois de deixar inúmeros ensinamentos às suas criaturas, o deus prometeu que um dia voltaria, e partiu; alguns acreditam que ele e seus filhos desapareceram nos céus. Outros afirmam que eles se foram pelo mar, caminhando sobre as águas até sumirem na distância. Mas todos sabem que, um dia, Huiracocha voltará.

POVO INCA: O Império Inca foi, provavelmente a civilização mais influente entre todas as culturas localizadas nas regiões dos Andes. Quando os espanhóis ali chegaram, no século XVI, o Império cobria uma enorme extensão da Costa Ocidental da América do Sul, do Peru ao Chile. A palavra “Inca” se refere ao governante supremo, que mantinha a sede de seu governo no Peru; mas acabou relacionada aos diversos povos que formavam o império e às suas peculiares formas de civilização. Habitavam terras vizinhas dos povos Araucanos, Fueguinos, Chibchas e Aymaras, tendo absorvido deles vários mitos e várias lendas; na verdade, as tradições dessas populações também se mesclaram com a dos Incas, num processo de troca cultural. Uma variação de seus mitos de origem diz que o Deus Criador (às vezes também denominado Huiracocha ou Viracocha), identificado com o Sol, foi o pai dos primeiros incas – Manco Capac e Mama Occlo – e que os enviou pelo mundo para civilizar os homens. Isso teria ocorrido por volta do ano 1.200 da era cristã. Mas há quem afirme que os primeiros incas viveram muito antes disso. Seja como for, suas conquistas foram enormes em terra, riqueza e obras arquitetônicas, mas duraram pouco tempo; o último soberano Inca, Atahualpa, seria aprisionado e morto por ordens do conquistador Francisco Pizarro.