Os astros, os meses e as estações – Mitologia Ameríndia

( Povo Tsimshian do Alaska )
O Chefe-do-céu, que viveu antes de tudo o que foi criado, tinha dois filhos e uma filha; seu povo era numeroso. Nesse tempo, o céu era escuro e nada se enxergava nele. O filho mais velho do chefe se chamava O-que-sai-bem-cedo; o segundo filho tinha o nome de O-que-anda-por-todo-o-céu; e a única filha mulher era conhecida como Apoio-do-sol. Todos eles eram muito fortes, porém o do meio era bem mais sábio e hábil que o primogênito. Esse rapaz achava uma pena que o céu sempre estivesse escuro. Um dia, O-que-anda-por-todo-o-céu chamou o irmão mais velho para irem cortar lenha. Juntos, eles cortaram um galho de cedro bem fino e o dobraram, formando um círculo do tamanho da cabeça de uma pessoa; prenderam ramos em toda a volta do círculo, criando uma máscara. Então atearam fogo à máscara de madeira, para que O-que-anda-por-todo-o-céu a colocasse diante do rosto e saísse correndo rumo ao Oeste. De repente, todos viram uma grande luz subir ao céu! Maravilhadas, as pessoas assistiram o filho mais novo do chefe correr de Leste a Oeste, movendo-se tão rapidamente que as chamas da máscara incendiada não o queimavam. A partir desse dia, todas as manhãs o rapaz repetia essa corrida, e iluminava o céu. Então toda a tribo se reuniu e se assentou em conselho. –“Estamos felizes por seu filho nos ter dado luz”- disseram ao chefe. –“Mas ele é rápido demais; deveria ir mais devagar, para que todos pudessem aproveitar melhor essa luminosidade.” O chefe contou a seu filho o que o povo havia dito, mas O-que-anda-por-todo-o-céu respondeu: -“Se eu for mais devagar, a máscara queimará bem antes que eu chegue ao Oeste.” Ele continuou a correr muito depressa, e as pessoas continuaram a desejar que se movesse mais lentamente. Até que um dia sua irmã disse: -“Vou tentar atrasar um pouco a marcha de meu irmão.” No dia seguinte, quando O-que-anda-por-todo-o-céu surgiu no Leste e iniciou sua caminhada rumo ao Oeste, Apoio-do-sol apareceu no Sul e pediu: -“Irmão, espere por mim!” Ela correu o mais rapidamente que podia e alcanço o irmão no meio do caminho. Então, a menina o abraçou com força e o segurou por um tempo, até que ele conseguiu se soltar e prosseguiu sua caminhada. É por causa do abraço da irmã que o Sol sempre para um pouco quando chega ao meio do céu. Com isso, o povo da tribo soltou gritos de alegria, e o pai de Apoio-do-sol a abençoou. Mas o chefe não estava satisfeito com o filho mais velho. Achava que O-que-sai-bem-cedo não era tão esperto e capaz como seu irmão, o Sol. Ao ver o desapontamento do pai, o rapaz chorou muito, desanimado. Enquanto ele se lamentava, O-que-anda-por-todo-o-céu chegou de seu passeio diário e foi dormir, pois estava exausto. Dormia profundamente, e o brilho de seu rosto projetava luz pelo buraco da tenda que servia para sair a fumaça. Quando O-que-sai-bem-cedo viu que toda a família estava dormindo também, esfregou carvão e gordura no próprio rosto. Com isso, o brilho que o irmão mais novo projetava pelo buraco da fumaça refletia-se em sua face; Então o mais velho chamou seu escravo e ordenou-lhe: -“Assim que você me vir subir ao céu no leste, saia gritando “Viva! Ele surgiu!”. Ele deixou a tribo e apareceu no céu, sempre refletindo em seu rosto o brilho do irmão na face suja de carvão. O escravo começou a pular e a correr, gritando: -“Viva! Ele surgiu!” Várias pessoas apareceram, ralhando com o escravo. Diziam elas: -“Por que faz tanto barulho?” Em resposta ele indicava o céu ao Leste. Todos olharam, viram a Lua nascendo, e gritaram: -“Viva!” O tempo passou, e muitos animais passaram a viver no mundo. Certo dia eles se reuniram em conselho e decidiram que o Sol deveria continuar percorrendo o céu de Leste a Oeste, e que ele seria a luz do dia. Quanto à Lua, deveria andar somente à noite. Depois disso, puseram-se a decidir quantos dias deveria haver em um mês. Os cães, que até então eram considerados mais sábios que os outros animais, foram os primeiros a falar. –“A Lua deve nascer por quarenta dias” – falou o seu porta-voz. Mas os outros animais não gostaram da ideia e ficaram em silêncio, vendo os cachorros contarem até quarenta com os dedos. Até que finalmente o porco-espinho espetou um dedo do cachorro-chefe, e disse: -“Quarenta dias em um mês? Não podemos viver assim, o ano seria muito longo. Deveria haver só trinta dias em um mês.” Todos os animais concordaram com o porco-espinho, e os cães perderam na votação. Graças a esse conselho é que os meses duram trinta dias, e há doze meses num ano. Mas os animais ficaram zangados com os cachorros, e decidiram que eles deveriam ir embora. É por isso que os cães detestam as criaturas da mata, principalmente os porcos-espinho, por causa daquele que espetou um deles no dedo e o humilhou durante o conselho. E o formato dos dedos dos cachorros ficou do jeito que é hoje por culpa da espetada do porco-espinho. Naquele mesmo conselho, os animais decidiram que nomes teriam os meses: Entre outubro e novembro é o mês das Folhas-que-caem. Entre novembro e dezembro é o mês do Tabu. Entre dezembro e janeiro é o mês Que-está-no-meio. Entre janeiro e fevereiro é o mês da Primavera-do-salmão. Entre fevereiro e março é o Mês-do-comer-arenque. Entre março e abril é o Mês-de-cozinhar-arenque. Entre maio e junho é o mês do Ovo. Entre junho e julho é o mês do Salmão. Entre julho e agosto é o mês do Salmão-corcunda. Entre setembro e outubro é o mês do Pião.Além disso, eles dividiram o ano em quatro estações: primavera, verão, outono e inverno. Enquanto todas essas coisas eram decididas, novidades aconteciam no céu. Certa noite, quando O-que-anda-por-todo-céu dormia, fagulhas escaparam de sua boca e se transformaram em estrelas. E, as vezes, quando ele se sentia muito feliz, pintava seu rosto com as tintas avermelhadas de sua irmã. Pelas cores, as pessoas podiam saber qual a temperatura que viria. Se sua cor vermelha colorisse o céu ao anoitecer, haveria bom tempo no dia seguinte; porém se a luz vermelha aparecesse pela manhã, era sinal de que uma tempestade se aproximava. E dizem que isso ainda acontece. Depois que o céu ganhou o Sol, a Lua e as estrelas, a filha do chefe, Apoio-do-sol, foi desprezada por seu povo, por ter tido uma parte tão pequena na criação dos astros. Infeliz, ela vagou em direção ao Oeste, entrou na água e suas roupas se molharam. Ao voltar para casa, pôs-se diante do fogo aceso por seu pai para se esquentar. Mas quando foi torcer as roupas molhadas, ela deixou as águas caírem sobre uma fogueira e elas evaporaram, formando uma grande nuvem de vapor que flutuou sobre a casa e se espalhou pela terra. Aquele vapor se tornou um nevoeiro úmido e moderou o calor que fazia. Seu pai a abençoou e todos na tribo aproveitaram o frescor do nevoeiro. E é por isso que, até hoje, todos os nevoeiros vem do Oeste, onde ficam as águas em que ela se molhou. O Chefe-do-céu se alegrou porque seus três filhos eram sábios e úteis; e até hoje O-que-sai-bem-cedo, a Lua, surge e some em uma jornada de quase trinta dias, para que as pessoas consigam contar o tempo. O Sol, O-que-anda-por-todo-o-céu, foi encarregado de criar coisas boas como as frutas e fazer com que elas venham em abundância. E Apoio-do-sol, a filha do chefe, refresca a terra quente com a neblina fresca.

POVO TSIMSHIAN DO ALASKA: Esse grupo tribal também era chamado Povo do Rio Skeenam um rio localizado na Colúmbia britânica, território canadense; mas no século XIX eles migraram para o Alaska, já em terras estadunidenses. Culturalmente, era um povo relacionado aos Haida e aos Kwakiutl – ambos grupos originários das costas do Canadá. Como esses, os Tsimshian sempre foram grandes escultores em madeira, e faz parte de seus costumes tecer belíssimas mantas, chamadas Chilkat. Confeccionadas com uma forma tradicional e complexa de tecelagem, típica da região, as mantas formam desenhos estilizados, cujos significados remetem aos animais presentes em seus mitos. Seu uso sempre esteve restrito às cerimônias e aos rituais das tribos. Hoje, a maioria dos Tsimshian vive na ilha Anette, em reservas, e eles são bastante atuantes na economia e na política do Alaska.