Os Ancestrais dos Nórdicos

Povos do Norte: engloba os antigos habitantes da Islândia, da Noruega, da Suécia, da Dinamarca, da Alemanha, da Holanda, da Ilha Orkney,  da Ilha Shetland, e da Ilha Faroé. Eles tem a mesma origem indo-europeia.

Costumes Indo-Europeus: Supõe-se que, há seis mil anos, eles tenham vivido nas estepes ao norte do Mar Negro e falassem uma língua denominada proto-indo-europeia, que deu origem as línguas sânscrita, iraniana, grega, latina, celta, germânica, e escandinavas.  Religião era centrada no culto aos mortos, na adoração do Deus do Fogo (realizada diariamente pelas famílias ao pé da lareira) e na reverência ao Deus do Céu (reservada unicamente aos sacerdotes) e aos poderes da Terra (realizada pelos chefes da família e seus filhos). Os indo-europeus também adoravam o Deus da Tempestade, que era também o senhor da guerra e protegia o povo de seus inimigos. O inimigo do Deus da Tempestade era o dragão, antigo símbolo das energias telúricas das culturas matrifocais, considerado uma criatura perigosa que se lançava das nuvens durante as tempestade e destruía a vegetação. Outras divindades celestes eram a Deusa Solar, filha do Pai Celeste, e seus irmãos, os Gêmeos Divinos, que representavam as Estrelas Matutina e Vespertina. A Lua era personificada como um touro branco, que era sacrificado na fase cheia e renascia, na lua nova, como um bezerro. Seu sêmen se espalhava pela terra e dava origem a cogumelos alucinógenos e ao orvalho que, colhido pelas abelhas, se transformava em mel.

O caráter patriarcal do panteão indo-europeu se estendia até mesmo aos poderes telúricos e aquáticos, sempre regidos por um casal – um Pai e uma Mãe.

Nas oferendas, além da carne e do sangue dos animais sacrificados, acrescentava-se uma bebida alcoólica fermentada. Não existem provas da existência de práticas xamânicas indo-europeias.

Ancestrais Nórdicos:
Por dependerem de fatores climáticos e de ciclos cósmicos e naturais, no período Paleolítico os povos nórdicos reverenciavam todas as manifestações da Natureza. As inscrições rupestres, que retratam suas crenças e seus cultos religiosos, foram entalhadas nas rochas ao longo do litoral e dos fiordes; nas proximidades de rios, cachoeiras, lagos e geleiras; nas paredes das grutas e em lugares distantes, até mesmo inacessíveis. Esses petróglifos reproduzem, com traços primitivos, figuras de ursos, alces, renas, peixes, pássaros, barcos, trenós, árvores, círculos, ondas e espirais. Algumas figuras humanas tem traços grotescos; outras participam de danças ou rituais, muitas vezes adornadas com chifres de animais. Supõe-se que inúmeras marcas de pés representassem as divindades, que não podiam ser retratadas como figuras humanas em razão de sua sacralidade. As concavidades circulares escavadas ao lado das figuras serviam de receptáculo para o liquido das oferendas.

Assim como em outras partes do mundo, os ancestrais dos povos nórdicos também praticavam o xamanismo, e a conexão com o mundo animal e espiritual era feita por meio de danças ritmadas e rituais extáticos. A dança ritual, ao som do tambor, servia para induzir o transe, estado propício para a invocação das divindades e para o contato com a alma grupal dos animais que seriam caçados ou pescados.

No período Neolítico, os cultos adquiriram uma estrutura mais organizada: as festividades acompanhavam a Roda do Ano (solstícios e equinócios) e comemoravam datas importantes do calendário agrícola (preparação da terra, plantio, e colheita). Os rituais para os mortos passaram a ser mais importantes; por volta de 3500 aC, começaram a ser construídas câmaras mortuárias, cobertas de blocos de pedra (cairns) nas quais os ossos dos cadáveres, depois de descarnados ao ar livre pelas aves de rapina, eram enterrados juntamente com vasilhas de comida e bebida, armas, objetos e joias. Os túmulos eram cercados de pedras no formato de círculos ou barcos, com uma dupla finalidade: impedir que os espíritos dos mortos vagassem sobre a terra e para protegê-los de entidades espirituais maléficas. Para encaminhar os espíritos após a morte, os familiares e os xamãs faziam cerimônias especiais e vigílias, atuando como mensageiros e condutores das almas na transição entre os mundos. O culto aos ancestrais desempenhava um papel fundamental na cultura neolítica, pois os antepassados eram vistos como protetores e guias da comunidade e deviam ser honrados. As pessoas pediam o auxílio de um ancestral passando a noite sobre o seu tumulo, à espera de uma mensagem ou visão. Esse costume (chamado utiseta) estava tão arraigado às crenças populares que, continuou a ser usado mesmo após a cristianização, apesar de proibido.

A divindade principal era a Mãe Terra, que assegurava a sobrevivência de todos os seres e recebia em seu ventre sagrado os mortos à espera do renascimento. Os estreitos corredores que conduziam às câmaras subterrâneas (com formas uterinas) reproduziam o canal vaginal materno. Ao lado das ossadas eram intencionalmente depositadas urnas quebradas, que simbolizavam a deteriorização do corpo físico e a libertação do espírito. Colocavam-se também estatuetas femininas e colares de âmbar, preciosos não apenas por serem joias, mas também por serem oferendas  para a Deusa Criadora e Ceifadora da Vida. A sociedade nórdica era matrilinear e matrifocal e a mulher, vista como a representante da Deusa na Terra, era sempre respeitada e honrada.

A partir do ano 2800 aC, os costumes funerários se modificaram: em vez de túmulos coletivos, as covas se tornaram individuais, diferenciadas de acordo com o sexo. Os homens passaram a ser enterrados em barcos de madeira ou em caixões de pedra (cists), tendo ao lado machados de pedra, flechas e amuletos em forma de animais; as mulheres, em troncos ocos de carvalho ou nos mesmos caixões de pedra, junto aos homens, com vasilhas, potes, tecidos, peles, joias de âmbar e tambores primitivos de argila.

Na Idade de Bronze (1800-500 aC) as oferendas depositadas nos túmulos e nos lugares sagrados tornaram-se mais complexas: ao lado dos equipamentos de guerra, ferramentas, provisões de comida, bebidas e ervas sagradas, objetos de prata e ouro também acompanhavam seus donos. As riquezas enterradas despertavam a cobiça dos saqueadores de túmulos, que por séculos destruíram preciosos vestígios do passado, dificultando assim os estudos arqueológicos e antropológicos.

Datam desse período inúmeras inscrições rupestres encontradas ao longo do litoral sueco e norueguês. As imagens mais comuns são de barcos, carruagens, arados, cavalos, peixes, alces, ferramentas e armas (como o martelo, o machado e a flecha), ostentados por homens de falo ereto e adornos de chifres. O machado e o martelo eram associados ao deus regente do céu, do trovão e do relâmpago, ao passo que a flecha identificava o deus da guerra. As mulheres, caracterizadas pelos longos cabelos e o esboço de seios, eram representadas sem armas, em pé na proa dos barcos, com os braços levantados, num gesto que lembrava uma oração ou uma benção. Muitas vezes elas tinham as pernas separadas, e entre elas, um circulo em baixo relevo, que provavelmente simbolizava o útero. Também foram encontradas gravadas nas rochas muitas peças em baixo relevo em forma de taça, as chamadas alfkvarnar ou elfcups (“taças dos elfos”), supostos receptáculos para oferendas de leite, hidromel, sangue menstrual ou gordura animal.

Tanto as figuras femininas quanto as cavidades para oferendas nas pedras comprovam o culto das divindades arcaicas Vanir, regentes da fertilidade da terra e da água, ao passo que os homens armados representam a classe mais recente dos deuses guerreiros Aesir, trazidos pelos invasores indo-europeus e sobrepostos ao pacífico panteão nativo.

A profusão de gravuras de homens com falo ereto deu origem a vários debates acadêmicos, nos quais prevaleceu a teoria de que se tratava de símbolos da fertilidade. Essa atribuição norte-europeia da fertilidade ao sexo masculino, é consequência do mito nórdico da criação, no qual os progenitores da humanidade era descritos como gigantes e deuses. Essas figuras fálicas prevalecem na Idade do Bronze para enfatizar o vigor masculino, mas sem que, para tanto seja excluída a Deusa, representada de maneira velada nos símbolos a ela associados: concavidades nas pedras, rodas solares, discos, mãos espalmadas (em posição de benção), marcas de pés (que assinalam sua presença), barcos e carruagens (para procissões e para viagem das almas), ondas, triângulos (símbolos púbicos), cestos, espirais, olhos, vulvas e seios (realçados com pigmento vermelho das próprias formas naturais das rochas).

A presença constante de barcos mostra a importância do mar, tanto como fonte permanente de alimento, quanto como meio de transporte e intercambio comercial. Os barcos e seu equivalente em terra, as carruagens, também eram associados à ideia da viagem do espírito para o “outro mundo”. Ambos eram veículos usados nas procissões dos cultos Vanir, e eram descritos, nos mitos, transportando o disco ou a roda solar.

Há provas conclusivas de que os povos nórdicos consideravam o Sol uma divindade feminina, assim como os japoneses, os sumérios, os eslavos, os bálticos, os egípcios, os celtas, os nativo – e os australianos. Um dos mais valiosos achados arqueológicos é uma estatueta em bronze, de uma mulher com discos de ouro no lugar dos olhos, ajoelhada, com os cabelos trançados, usando apenas uma saia curta de franjas e um colar. Uma de suas mãos segura o seio e a outra, levantada, sugere o uso de rédeas. Próximo a ela foi encontrada uma serpente, supostamente sua montaria. Outro achado importante data de 1400 aC e também  é relacionado ao culto solar: uma carruagem de bronze, com seis rodas, puxada por um cavalo, leva um enorme disco de ouro, gravado com intrincados desenhos de círculos e espirais. Esse motivo – carruagens e barcos levando discos e rodas solares – pode ser encontrado em inúmeras inscrições rupestres em rochedos e grutas, tanto desse período quanto do anterior – o Neolítico. A carruagem simboliza a jornada do Sol, que desliza pelo céu durante o dia e desaparecia dentro da água, ou da terra, ao entardecer. Os antigos acreditavam que a deusa solar descansava durante a noite e reaparecia para cumprir sua missão no dia seguinte. No mito da eterna jornada solar, conta-se que, ao amanhecer, um peixe retirava o Sol do barco Noturno, passando-o para o Barco Matutino, no qual ele percorria o Céu. Ao meio-dia, um cavalo assumia o controle do Barco Diurno até o entardecer, quando uma serpente ocultava o Sol e o barco com seu corpo, auxiliando em seu mergulho no Mundo Subterrâneo, de onde o peixe iria retirá-lo novamente, na manhã seguinte. A associação do Sol com a água e com a terra reforça os significados de vitalidade, sustentação da vida e fertilidade desses elementos, considerados atributos da Deusa. A roda solar era o emblema da viagem do Sol pelo dia e pela noite, pelo verão e pelo inverno; a cruz solar representava os momentos cruciais, o nascer e o pôr-do-sol, o meio-dia e a meia-noite; a espiral reproduzia a eterna trajetória solar. Os discos solares são semelhantes às rodas, introduzidas na Escandinávia pelos invasores indo-europeus. Com muito frequência eles podem ser vistos nos petróglifos, adornados às vezes com pés, mãos ou asas, transportados por barcos ou carruagens, entre as pernas das mulheres ou nas mãos dos homens. Existia uma misteriosa relação do Sol e os cisnes e gansos selvagens, que podiam voar e também nadar, ambivalência representada por asas e pés. Alem das figuras humanas e dos símbolos isolados, também foram encontrados pares – tanto de homens quanto de animais ou pássaros. Acredita-se que as figuras geminizadas estavam ligadas ao culto dos Gêmeos Celestes, representados pelos Alcis (ou Aclis), por Frey e Freyja, pelo Sol Nascente e o Poente, pela Estrela Matutina e Vespertina. Ainda que um número reduzido de estatuetas femininas tenha sido encontrado, é evidente sua finalidade como objetos ritualísticos sagrados, nas praticas de cura e nos ritos de passagem para o Outro Mundo. Alguns poucos petróglifos retratam casais abraçados, que simbolizavam, além do amor humano, o casamento sagrado do Pai Celeste e da Mãe Telúrica, conceito presente em todas as culturas xamânicas. Uma famosa gravação encontrada em uma pedra na Dinamarca retrata um homem de falo ereto e uma mulher ao lado de uma arvore. O casal, emoldurado por uma guirlanda de folhagens, estende os braços um para o outro, numa descrição perfeita do encontro entre o Deus da fertilidade e a Deusa da terra. O arado também aparece em algumas inscrições, puxado por homens também com o falo ereto, cena que lembra os antigos ritos sexuais para fertilizar a terra durante as cerimônias da primavera. As danças rituais são representadas tanto por gravações quanto por estatuetas de mulheres com saias de franjas, representadas em poses acrobáticas dentro de barcos ou posições que se assemelham à atual dança do ventre; essa suposição é reforçada pela presença de discos de bronze no ventre das mulheres.

Sami: Até o advento do cristianismo, o xamanismo era amplamente difundido e muito valorizado nas regiões do norte da Europa. Atribuem-se aos habitantes nativos – chamados sami – as características matrilineares das sociedades antigas, bem como as praticas xamânicas, curativas e proféticas. Apesar de serem um povo muito antigo, os sami são pouco estudados e praticamente desconhecidos. Eles habitam o norte da Escandinávia e da Finlândia e a península Kola, e tem parentesco com os finlandeses, os samoiedos e as tribos siberianas. Pesquisadores supõem que eles descendam das civilizações neolíticas europeias – construtoras de enigmáticos  monumentos megalíticos de Malta, da França e das Ilhas Britânicas – ou de uma tribo de pigmeus africanos – em razão de sua baixa estatura e pele escura – que teria emigrado para o norte da Europa antes da era glacial. Atualmente existem cerca de setenta mil sami, que vivem na reserva de Sapmi, preservando muito de suas crenças, seus costumes e seu artesanato. Antigamente eles viviam em comunidades matrifocais e cultuavam a Grande Mãe, que se manifestava nas florestas, grutas, pedras, rios e animais. Eles reverenciavam suas personificações como a Mãe Terra, a Mulher do Sol e da Lua, a Mãe Ursa, as Mães das Florestas e as Akkas (avós), que moravam no céu e na terra e supervisionavam a formação dos fetos e os nascimentos. Os sami consideravam os espíritos da natureza seus ancestrais e se comunicavam com eles por intermédio dos noajddes ou näjder – “aqueles que enxergam no escuro” – ou seja, os xamãs. Mesmo após sua cristianização forçada no século XVI, eles continuaram a praticar o xamanismo e seus cultos. Objetos sagrados, deles confiscados pelos missionários a atualmente exibidos em museus, testemunham suas crenças e praticas religiosas – absorvidas pelos povos nórdicos, seus vizinhos.

Existem provas da existência de uma extensa e antiga cultura xamânica ao redor do Polo Norte, que inclui, além dos sami, os inuits (esquimós) da Groelândia, do Canadá e do Alasca. Autodenominados “o primeiro povo”, esses povos nativos afirmam sua antiguidade nessas regiões – onde afirmam residir desde o fim da era glacial, há cerca de nove mil anos – e se recusam a ser chamados de lapões ou esquimós – para eles um termo pejorativo. Assentamentos sami datados de 6000 aC comprovam a veracidade dessas afirmações.  Recentemente, foram descobertos na Suécia, perto do rio Namforsen, petróglifos datados de 4000 a 3000 aC. Existem vestígios de assentamentos neolíticos em Jokkmokk, na Lapônia, com um relevante conteúdo simbólico e religioso, associado a um antigo culto xamanico à “Mãe-Ursa” (simbolizada pelas constelações Ursa Maior e Ursa Menor, reverenciadas como divindades pelos povos nórdicos e utilizadas como marcos na navegação).

Uma teoria proposta pelo casal de pesquisadores suecos Gunnel e Goran Lilijenroth, afirma a existência de dois povos – kosma e fosna – descendentes de tribos paleolíticas, que teriam migrado do sul da França para o norte da Europa. Ambos os povos eram matrifocais e cultuavam a deusa Hel, considerada a personificação do poder protetor das montanhas, contra as geleiras e as enchentes. Acreditando-se “filhos da deusa Hel”, eles acreditavam na existência de um “outro mundo” dentro das montanhas, para onde iriam, após a morte, aguardar o renascimento, recebendo amor, cura, comida e calor. As palavras helig e hel significam “sagrado” e “pleno” e descrevem atributos da deusa Hel mas, distorcidas pelos monges cristãos, passaram a ser sinônimo de “inferno” na teologia cristã (hell), a despeito dos inúmeros nomes de pessoas e lugares que tem esse prefixo. Por mais expressivos que sejam os achados arqueológicos e as teorias a eles ligadas, faltam registros que expliquem o verdadeiro significado das inscrições e dos rituais por eles sugeridos. As primeiras informações escritas, bastante tendenciosas, pertencem a fontes romanas.  Muitos soldados teutões serviam em legiões romanas. Ao longo das fronteiras entre os dois países houve uma mescla de crenças e um sincretismo de divindades integrantes dos dois panteões. Graças a esse intercambio, informações valiosas foram resguardadas, como os rituais para a deusa da terra Nerthus, o culto das “Matronas” – respectivamente as Disir ou Idisis –, as ancestrais protetoras, a correspondência entre os dias da semana e as divindades, e as oferendas votivas.

  O historiador romano Tácito e o próprio Júlio César escreveram profusamente sobre os “bárbaros”, mencionando aspectos e costumes que consideravam bizarros ou antagônicos aos preceitos de sua sociedade. Devemos a eles o conhecimento dos cultos escandinavos ao Sol, ao fogo (equiparado por eles ao culto de Vulcano, o deus romano da forja), a Odin (equivalente a Mercúrio), a Tyr (identificado com Júpiter), às deusas Nerthus e Nehelenia (assemelhadas a Gaia e Ísis) e aos Gêmeos Celestes, semelhantes a Castor e Pollux. Apesar dos comentários tendenciosos e da ênfase dada aos sacrifícios de animais (e algumas vezes de escravos e prisioneiros), Tácito, em seu livro Germania, descreve de forma acurada os padrões morais e éticos dos nórdicos, apelidados de “puritanos”, em comparação aos depravados romanos. Admirado com o status social elevado das mulheres nórdicas, Tácito menciona o papel importante por elas exercido na sociedade, nas batalhas e na religião; cita o nome de mulheres famosas (sacerdotisas e profetisas) e descreve o uso oracular das runas e as invocações dos deuses antes das batalhas.

 Com o declínio e a desintegração do Império Romano (350-550 dC), inicia-se um período histórico conhecido como “Migração”, no qual tribos celtas e teutônicas se deslocaram para o oeste e o norte da Europa, disseminando seus cultos, símbolos e mitos. Floresce o culto a Wodan – ou Odin -, o poderoso deus da guerra e da morte, patrono da inspiração poética e da magia. Trata-se de um período de lutas e conquistas, enaltecidas e louvadas em sagas (histórias) e canções. Os teutões viviam em pequenas tribos guerreiras, chefiadas por aristocratas, na busca constante por novas terras para conquistar ou saquear. Eles tinham orgulho das façanhas de seus reis e guerreiros, eram corajosos e leais com os chefes e companheiros, respeitavam suas mulheres e valorizavam as leis tradicionais atribuídas às divindades que veneravam. Essas deidades eram aquelas que regiam as batalhas, garantindo a vitoria em troca de sacrifícios de sangue e oferendas de armas e joias, bem como aquelas que regiam os fenômenos celestes (raio, trovão, tempestade, chuva e neve) ou propiciavam a prosperidade das colheitas e das comunidades. Eles reverenciavam também o Mundo Subterrâneo, morada de gigantes e monstros e abrigo das almas dos ancestrais, temido pelas forças desconhecidas que era capaz de desencadear. A realidade desses povos era permanentemente obscurecida por guerras, saques e mortes, ameaçadas por tempestades, ondas gigantes, invernos longos e gelados, granizo e inundações, mas também alegrada por festas, comemorações e uma permanente admiração pela beleza – da Natureza e das mulheres. Por isso, sua visão do mundo divino e sobrenatural era permeada pelos reflexos da sua realidade cotidiana, da eterna dança de luz e sombra, verão e inverno, vida e morte.

Ao final das migrações (séculos VI e VII), após longa resistência, os alemães continentais e os anglo-saxões foram vencidos “pela cruz e pela espada” e finalmente convertidos ao cristianismo – inicialmente assimilado pelos nobres, posteriormente imposto ao povo. Na Escandinávia, no entanto, os cultos pagãos resistiram ainda mais por alguns séculos, florescendo ao longo de todo período viking (792-1066 dC). A maioria das inscrições rúnicas data dessa época, bem como alguns tesouros da arte sacra, como os valiosos chifres de Gallehus – confeccionados em ouro maciço e gravados com cenas de mitos – encontrados em um pântano na Dinamarca, e um grande colar de ouro, de cinco voltas, ornamentado com intrincados berloques e figuras de homens e animais. O famoso caldeirão de Gündestrup, de nítida influencia celta, também foi encontrado na Dinamarca, mas sua confecção é anterior aos vikings.  Inspirados pela arte romana, artesãos escandinavos começaram a confeccionar medalhões de ouro – chamados bracteatas -, que eram gravados com runas, figuras míticas e símbolos sagrados, e usados como talismãs de poder e proteção. À medida que os guerreiros vikings se aventuravam para longe de sua pátria, em busca de comércio, conquistas e pirataria, eles também levavam consigo crenças, mitos e costumes, e os transmitiam àqueles que venciam. Ao mesmo tempo, eles assimilaram alguns hábitos cristãos e passaram a usar o martelo de Thor à guisa de crucifixo, a erguer pedras funerárias com inscrições rúnicas e a construir templos pagãos de madeira, a exemplo das igrejas cristãs. Em contrapartida, ao entrarem em contato com as tribos sanguinárias das estepes russas, os vikings aumentaram os sacrifícios feitos para os deuses (principalmente Odin, Thor e Tyr) e substituíram os animais por seres humanos – prisioneiros e escravos. Embora alguns episódios possam ser verídicos, devemos nos lembrar de que os relatos macabros que descreviam a fúria assassina dos vikings eram feitos por monges cristãos, que obviamente deturparam ou omitiram os verdadeiros significados dos cultos pagãos.  O termo latino paganus designava a população rural que continuava a cultuar as antigas divindades, mesmo após a conversão da nobreza. Os termos heathen (inglês) e heiden (alemão), que significavam “oculto, escondido”, passaram a ser sinônimos de “pagão” no sentido pejorativo da palavra, identificando um herege perigoso para a doutrina cristã. Os poucos testemunhos escritos durante o período pagão consistem em curtas inscrições rúnicas sobre metal, pedra e osso, redigidas de forma abreviada ou criptográfica, com alusões a seres míticos, encantamentos, maldições ou elogios aos heróis mortos em combates.

As evidencias de cultos antigos pré-cristãos provém principalmente dos achados arqueológicos, dos nomes dos lugares e das crenças a eles ligados, dos costumes folclóricos e dos poemas e narrativas colecionadas por historiadores, poetas e etnógrafos.  O dinamarquês Saxo Grammaticus escreveu nove livros sobre a historia pagã, mas seu estilo é confuso e seus comentários mostram-se parciais e tendenciosos. Ele considerava “inapropriado” o comportamento dos deuses para a moral cristã e retirava as “cenas promiscuas” dos mitos. O islandês Snorri Sturluson (1179-1241 dC), por sua vez, poeta e historiador, escreveu um compendio sobre os mitos nórdicos como orientação aos futuros poetas, fazendo referencias exatas a nomes e fatos. Apesar de cristão, Snorri compilou lendas e histórias com muita dedicação, formando uma coletânea chamada Prose Edda (posteriormente denominada Younger Edda) e algumas sagas. Em 1643 dC, na Islândia, em uma antiga fazenda em ruínas, foi encontrado um manuscrito atribuído ao sacerdote e mago islandês Saemundr, “o Sábio”, possivelmente escrito no século XIV. Constituído de poemas e relatos mitológicos, ele passou a ser conhecido como o Codex Regius, ou Poetic (Elder) Edda, principal fonte de informação dos estudiosos atuais. As sagas islandesas (contos da original tradição oral, destruída pelo cristianismo), escritas nos séculos XIII e XIV, preservaram muito da riqueza pagã, apesar dos acréscimos, omissões ou interpretações posteriores, feitas pelos tradutores.

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