Livro dos Mortos (cujo nome original, em egípcio antigo, era Livro de Sair Para a Luz ou Saída para a Luz do Dia) é a designação dada a uma coletânea de feitiços, fórmulas mágicas, orações, hinos e litanias do Antigo Egito, escritos em rolos de papiro versões mais sofisticadas eram compostas de ricos ornamentos tipográficos, conhecidos como vinhetas. E colocados nos túmulos junto das múmias.
O objetivo destes textos era ajudar o morto em sua viagem para o outro mundo, afastando eventuais perigos que este poderia encontrar na viagem para o Além. Mais especificamente, era uma coletânea aleatória de palavras mágicas que se julgava que fossem importantes para os mortos quando confrontassem Osíris, o juiz e governante do reino dos mortos.
O livro era posto sob a cabeça da múmia ou junto dela, ou então copiavam-se trechos dele na tumba.
De uma natureza muito diferente eram os antigos Textos de Execração egípcios, que se originaram no Médio Império, provavelmente durante a Décima Segunda Dinastia. Tais textos compreendiam os meios pelos quais os faraós reinantes amaldiçoavam cerimonial e magicamente, todos os seus inimigos, tanto atuais como potenciais. Os textos foram recuperados de duas formas, ou como vasilhas de cerâmica vermelha, ou como estatuetas humanas grosseiras de argila, todas elas com a inscrição de maldições específicas, que eram, então, ritualmente esmagadas, de acordo com os princípios da mágica favorável que indicava como deveria ser despedaçada toda a oposição aos faraós. Os textos têm uma importante influência sobre a geografia e topografia do antigo Oriente Médio, uma vez que nas listas asiáticas há nomes de cidades cuja identificação ainda está longe de estar correta. Os nomes pessoais também são interessantes, uma vez que mostram, entre outras coisas, que os habitantes assentados da Palestina e da Síria estavam tendo que acomodar estranhas nações em seu meio, durante o período do Médio Império no Egito.
Composições literárias como estas, vindas do Oriente Médio, também esclarecem consideravelmente as condições políticas e sociais da época, como podemos exemplificar mencionando as Fábulas de Sinuhe. Esta interessante história egípcia narrava as aventuras de um nobre do século XX a.C, que teve que fugir para a Palestina para procurar asilo político, quando o idoso faraó Amenemés I morreu. As mesmas considerações se aplicam a uma época posterior da história egípcia, refletida na narrativa que descrevia as Jornadas de Wen-Amun. Esta composição mostra a baixa estima em que tinha caído o poder egípcio, aos olhos das nações vizinhas, por volta de 1100 a.C, descrevendo as frustrações e humilhações que um sacerdote egípcio encontrou na sua missão na Fenícia, para obter cedro para o barco sagrado do deus Re.
Não resta dúvida de que o julgamento dos atos após a morte devia preocupar, e muito, a maioria dos egípcios, religiosos que eram. Para os egípcios esse conjunto de textos era considerado como obra do deus Thoth. As fórmulas contidas nesses escritos podiam garantir ao morto uma viagem tranquila para o paraíso e, como estavam grafadas sobre um material de baixo custo, permitiam que qualquer pessoa tivesse acesso a uma terra bem-aventurada, o que antes só estava ao alcance do rei e da nobreza. Em verdade, essa compilação de textos era intitulada pelos egípcios de Capítulos do Sair à Luz ou Fórmulas para Voltar à Luz (Reu nu pert em hru), o que por si só já indica o espírito que presidia a reunião dos escritos, ainda que desordenados. Era objetivo desse compêndio, nos ensina o historiador Maurice Crouzet, fornecer ao defunto todas as indicações necessárias para triunfar das inúmeras armadilhas materiais ou espirituais que o esperavam na rota do “ocidente”.
O Livro dos Mortos não era um “livro” no sentido coeso da palavra. A atual ideia de livro sugere a existência de um autor (ou autores) que propositadamente redige um texto com um princípio, meio e fim. Em vez disso, os textos que integram o que hoje se denomina por Livro dos Mortos não foram escritos por um único autor nem são todos da mesma época histórica. Um dos escritores mais conhecido por colaborar com uma parte desse livro foi Snefferus S. Karnak. Os antigos egípcios denominavam a esta coletânea de textos como Prt m hru , o que pode ser traduzido como “A Manifestação do Dia” ou “A Manifestação da Luz”. A atual designação é disputada entre duas origens. A primeira refere-se ao título dado aos textos pelo egiptólogo alemão Karl Richard Lepsius quando os publicou, em 1842 – Das Todtenbuch der Ägypter (Todtenbuch, Livro dos Mortos). Afirma-se igualmente que o título possa ser oriundo do nome que os profanadores dos túmulos davam aos papiros que encontravam junto às múmias – em árabe, Kitab al-Mayitun (Livro do Defunto).
O Livro dos Mortos data da época do Império Novo, período da história do Antigo Egito. No entanto, a obra recolhe textos mais antigos – do Livro das Pirâmides (Império Antigo) e do Livro dos Sarcófagos (Império Médio).
No Império Antigo foram gravadas várias fórmulas mágicas sobre os muros dos corredores e das câmaras funerárias das pirâmides de Sakara, pertencentes a vários reis da V e da VI dinastias (Unas, Teti, Pepi I, Merenré e Pepi II). Estes textos são conhecidos como Textos das Pirâmides. Nesta altura a possibilidade de uma vida após a morte era apenas acessível aos faraós e sacerdotes. A partir da VII dinastia egípcia verifica-se uma “democratização” da possibilidade de ascender a uma vida no Além. Esta não será mais reservada apenas ao soberano, mas será também possível para os nobres e os altos funcionários, e progressivamente estender-se-á a toda a população. Durante o Império Médio os textos usados pelos reis foram modificados, ao mesmo tempo que surgiram novos textos que mantinham a sua função de ajudar o morto no caminho do Além. Os textos passaram a ser escritos no interior dos sarcófagos (na madeira) dos nobres e dos funcionários, sendo por isso conhecidos como Textos dos Sarcófagos.
Durante o Império Novo reuniram-se textos funerários de períodos anteriores (Textos das Pirâmides e Textos dos Sarcófagos), ao mesmo tempo que se redigiram novos textos, escritos em rolos de papiro e colocados junto das múmias nos túmulos. A coletânea destes textos é hoje conhecida como Livro dos Mortos.
Leia também sobre A Origem do Livro dos Mortos.
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