A Criação da Terra – Mitologia Ameríndia

Como Nanabozho criou a Terra

(Mito Algonquin do Canadá)

Num tempo muito, muito distante, do qual ninguém pode se lembrar, vivia Nanabozho, o feiticeiro criador. Ele era jovem e morava na água, pois não havia mais nenhum lugar para se viver. Nada existia além de um mar sem fim. No alto, viam-se as estrelas e as nuvens; entre elas um vento frio soprava suavemente, e seu sopro era o único que se ouvia. O resto era o silêncio pairando sobre as águas. Durante muito tempo, Nanabozho viveu sozinho, mas depois decidiu que precisava de criaturas para lhe fazer companhia. Então ele criou a tartaruga, e lhe deu uma carapaça forte e protetora. Depois criou o rato- almiscarado, e lhe deu um pelo bem longo – tão longo que podia abrigar bolhas de ar, para que o animal tivesse como respirar quando mergulhava no imenso oceano: era só enfiar o focinho entre o próprio pelo e absorver o ar ali guardado. Depois disso, Nanabozho criou a lontra, que sabe nadar tão bem e tão depressa. E também o castor, dando-lhe uma cauda achatada e uma pelagem marrom bem compacta. No grande mar que cobria o mundo, os quatro animais fizeram companhia ao criador. Nadavam com ele, conversavam, pescavam os peixes, que faziam parte do mar, para se alimentar. Porém Nanabozho acabou se aborrecendo com as conversas deles e começou a imaginar como criar seres mais interessantes. Concluiu, porém, que o problema não eram seus companheiros, era o excesso de água. “Quero descansar meus pés em algo sólido”, ele refletiu. “E se eu ficar em pé e colocar um pé diante do outro, poderei andar! Estou cansado de nadar.” Mas onde conseguir algo sólido em toda aquela água que cobria o mundo? Certo dia, ao ver a lontra nadando rapidamente e mergulhando, Nanabozho teve uma ideia. Devia haver algo sólido sob a água, impedindo que o mar escoasse! Assim pensando, Nanabozho respirou fundo para reter bastante ar e mergulhou no oceano sem fim. Nadou para baixo, cada vez mais para o fundo, até que as águas ficaram tão escuras, que nada se podia enxergar. E o fundo parecia não existir… Quando o ar que havia inalado acabou, o criador voltou à superfície para respirar. Os quatro animais estavam preocupados com ele, pois não sabiam para onde tinha ido. Ele explicou aos amigos o que tentara fazer e que não encontrara o fundo do mar, pois não pudera respirar mais tempo sob a água. Mas quando disse que tinha outra ideia, os amigos trataram logo de sair de perto – pois, quando Nanabozho tinha ideias, sempre os metia em apuros! – Você, castor! – disse o criador, sem se perturbar -, vai mergulhar para mim. Vou amarrar minha linha de pesca em sua cauda e puxá-lo de volta se ficar sem ar para respirar. O castor não queria fazer aquilo, mas não podia se recusar, pois Nanabozho era um grande feiticeiro e sempre alcançava tudo o que desejava. O animalzinho olhou para os amigos com os olhos tristes, sacudiu a cauda, na qual o criador prendera a linha de pesca, e mergulhou. Os outros ficaram em expectativa. Por algum tempo Nanabozho sentia a linha esticada deslizar por suas mãos, o mergulho do castor parecia sem fim. De repente ela parou e ficou folgada. O criador começou a puxar, puxar… a tartaruga, a lontra e o rato-almiscarado se entreolharam tristes. Finalmente Nanabozho recolheu o corpo inerte do pobre castor. Seus pulmões não haviam aguentado. Durante alguns dias, nada aconteceu, mas logo o criador desejou tentar de novo. – “Agora é a vez do rato-almiscarado” – disse ele. – Tenho uma nova linha de pesca e vou emendar com a outra, assim poderá ir mais fundo. Naturalmente, o animal não queria fazer a tentativa. – “Veja só o que aconteceu com o castor!” Ele choramingou. Nanabozho lhe disse: – “ Você sabe como armazenar ar em seu pelo, poderá respirar por bastante tempo sob a água.” O rato-almiscarado sabia que conseguiria armazenar só um pouquinho de ar, mas não negaria o pedido do feiticeiro. Deixou que ele amarrasse a linha de pesca em sua cauda, despediu-se dos companheiros com um olhar tristonho e mergulhou. A linha deslizou pelas mãos de Nanabozho mais rapidamente desta vez, pois o rato-almiscarado nadava depressa, querendo chegar logo ao fundo do oceano. Mas o tempo passou e ele não voltava; até que a linha parou completamente de se mover. O criador começou a puxar, puxar, puxar. E finalmente eles viram o corpo do animalzinho subir à superfície. Ele também não sobrevivera ao mergulho; mas todos perceberam que, entre as patinhas da frente, segurava alguma coisa pequena e marrom. Nanabozho retirou com cuidado o material que o rato-almiscarado trouxera, com tanto sacrifício. Era um punhado de coisa molhada e grudenta; ele colocou sobre a carapaça da tartaruga para secar. Após cheirar e provar a substância, anunciou: – “Acho que isto é barro.” O feiticeiro, a lontra e a tartaruga resolveram esperar que aquela lama estivesse quase seca. Mas Nanabozho cansou de aguardar e começou a trabalhar nela com os dedos. O pequeno bocado de lama foi crescendo entre suas mãos enquanto ele o moldava. Até que aumentou tanto de tamanho que se transformou em uma grande extensão de chão, onde muitas criaturas poderiam habitar! E essa foi a primeira terra que existiu em nosso mundo. Todos viram que ali havia espaço para o crescimento de plantas e árvores. Havia sulcos para que corressem rios. Os calombos no barro se transformaram em montanhas, as depressões se encheram de água e viraram lagos. Os animais e as pessoas já podiam existir, pois agora possuíam um lugar para morar; e Nanabozho, o criador, conseguiria andar ao invés de nadar. Mas como ele tinha sido muito apressado e não deixara o barro secar completamente, alguns pontos permaneceram molhados e grudentos. Estes são os pântanos, que jamais ficarão secos.


POVO ALGONQUIN: Consta que os Algonquins foram os primeiros grupos nativos a terem contato com os colonizadores, e que tinham voas relações com os franceses, mas não eram grandes inimigos das tribos dos iroqueses. Eram povos sedentários, dotados de técnicas adiantadas de agricultura e extrema habilidade no curtimento das peles de cervo e na confecção de vestes. Também são famosos os mantos de plumas que teciam. Vários grupos tribais foram designados como Algonquins ou Algonkins. O nome designa ainda a língua básica de muitos povos, considerados integrantes do maior grupo linguístico da América do Norte. No Canadá, eles eram originários do Leste, acima da região dos grandes lagos. Grupos tribais canadenses incluíam os Beothuk, Micmac, Malecite, Montagnais, Naskapi, Ojibwa, Cree e os Algonquin propriamente ditos. Também havia povos Algonquin no território dos Estados Unidos; diz-se que eram numerosíssimos e se espalhavam desde o Oceano Atlântico até as Montanhas Rochosas. Compreendiam, entre muitas outras tribos, os Cheyenne, Arapaho, Chippewa, Pottawatomi, Illinois, Miami, Shawnee; na Costa Leste estavam radicados os Pequod, Mohegan, Delaware, Abnaki. Também se contam entre os algonquins as três tribos Blakcfoot (Pés-negros): os Siksika, os Blood, os Piegan.

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