Teseu e o Minotauro

Nada demonstra melhor o caráter guerreiro e valente de Teseu — um dos heróis mais famosos da Grécia — do que um curioso episódio da sua infância.

Estava um dia o pequeno Teseu em casa de seu avô quando o velho recebeu a visita de ninguém menos do que Hércules — o maior de todos os heróis.

Junto com seus amigos, Teseu correu a espiar, sem conseguir acreditar que estava sob o mesmo teto que aquela lenda viva. Hércules, antes de sentar-se, tirou sua pele de leão de sobre os ombros, para estar mais à vontade, e lançou-a para o mesmo canto onde estavam aglomeradas as crianças.

Nem bem a pesada pele caíra ao chão, todos os meninos puseram-se a correr, gritando por suas mães, pois na sua inocência julgavam estar na presença de um leão verdadeiro. Apenas o pequeno Teseu permaneceu firme, encarando a fera. Depois também deu as costas, mas em vez de fugir, correu para a cozinha e voltou de lá com um machado que arrebatara das mãos de um escravo e caiu sobre a pele, como se estivesse enfrentando um leão de verdade.

A partir de então Teseu cresceu, tornando-se cada vez mais famoso devido às suas façanhas. Duas delas merecem destaque, pelo curioso das aventuras.

Na primeira delas, Teseu enfrentou um temível bandido das estradas, chamado Sínis.

Este vilão aterrorizava todo o istmo de Corinto, impondo às suas vítimas uma cruel tortura. Após curvar duas árvores paralelas, amarrava a elas os braços e pernas dos prisioneiros.

Em seguida soltava os troncos, fazendo com que as árvores retornassem à sua postura normal, despedaçando, assim, os infelizes.

Teseu enfrentou-o e depois de derrotá-lo fez o bandido provar do próprio veneno, e ele morreu despedaçado.

Na outra aventura, Teseu defrontou-se com um maníaco, chamado Procusto.

Este bandido passava a maior parte do dia escondido numa caverna, como uma aranha na sua toca. Tão logo escutava os passos de alguém que se aproximava. Procusto apoderava-se da vítima e a levava de rastos para dentro da cova. Amarrando, então, o desgraçado sobre o leito, ficava ao seu lado, a estudar se as rnedidas do corpo eram exatamente as mesmas do leito. Se sobravam pedaços do corpo para fora da cama, Procusto, munido de uma longa faca, cortava-os com meticulosa precisão, até tornar compatíveis os dois. Se, no entanto, o corpo era demasiado pequeno, o bandido o amarrava e espichava até ficar do tamanho ideal.

Teseu também liquidou com Procusto, embora a lenda não especifique como o fez.

Mas o grande feito, aquele que imortalizou definitivamente o herói, foi a terrível batalha que travou contra o Minotauro — um monstro terrível, que tinha ronco e cabeça de touro e o restante do corpo sob a forma humana.

Os atenienses estavam naquela época sob o jugo de Minos, o cruel rei de Tebas.

Este rei decidira cobrar um tributo anual aos habitantes de Atenas: numa determinada época do ano deveriam ser entregues a ele sete rapazes e sete donzelas, para serem lançados vivos no temível labirinto que Minos fizera construir em seu reino pelo inventor Dédalo, pai do infeliz Ícaro das asas de cera. Dentro deste labirinto vivia o Minotauro, monstro insaciável que se nutria de carne humana.

Quando Teseu soube que as novas vítimas já haviam sido escolhidas e estavam para ser embarcadas para Creta, procurou seu pai, rei dos atenienses, e disse:

— Permita, meu pai, que eu tome o lugar destes infelizes!

O rei, espantado com a coragem do filho, a princípio relutou.

— Não. Como poderia mandar meu próprio filho e sucessor para a morte? Teseu, no entanto, firmou pé em sua decisão:

— Por que recusa minha oferta, se em vez de quatorze vítimas terá de oferecer ao monstro apenas uma?

Os dois discutiram longamente sobre o assunto, mas a teimosia de Teseu acabou prevalecendo sobre a vontade do pai. Assim, no mesmo dia, Teseu embarcou num navio de velas negras.

— Prometo, papai, caso derrote a fera, retornar com as velas brancas -disse o jovem, enquanto o navio ganhava o alto-mar.

Depois de navegar por vários dias, a embarcação finalmente atracou nas terras de Minos.

O rei de Tebas, furioso ao perceber que somente lhe haviam mandado uma vítima, exclamou:

— Como ousam desobedecer às minhas ordens? Eu exigi sete moças e sete rapazes, e me mandam apenas um.

Ariadne, a bela filha do rei, assistia a tudo, sem poder esconder, no entanto, o seu fascínio pelo jovem e ousado aventureiro.

— Poderoso Minos, talvez não esteja lembrado de mim, mas eu sou Teseu, filho do rei de Atenas, e venho oferecer minha vida em lugar da deles — disse o herói. — O senhor dispõe agora da vida do filho de um rei. Isto não lhe basta?

Minos acabou aceitando a troca, enquanto Ariadne tornava-se cada vez mais apreensiva.

— Amanhã você será lançado dentro do labirinto — disse o rei, com um sorriso de escárnio. — Veremos se terá a mesma disposição.

Durante a noite, Teseu esteve prisioneiro na torre do palácio de Minos. Estava fortemente vigiado, mas isto não impediu que Ariadne o procurasse.

— Teseu, estou admirada de sua coragem! — disse a bela jovem. O herói a encarou com surpresa:

— O que quer aqui?

Olhando para os lados a fim de ver se não era observada por algum dos carcereiros, Ariadne abriu uma brecha na parte superior do vestido e dela retirou algo que estendeu às mãos de Teseu.

— O que é isto? — perguntou ele, tomando o objeto.

— É um novelo de lã, não está vendo? — disse ela, em voz baixa.

— Mas para que me servirá?

— Amanhã, quando você for lançado ao labirinto, leve-o junto. À medida que for penetrando no labirinto, vá soltando o fio pelo chão, a fim de marcar o caminho para a volta. De outro jeito, você jamais poderá retornar.

Ariadne já ia se retirando quando Teseu tomou uma de suas mãos e a beijou.

Mal o dia amanheceu e Teseu foi conduzido pelos guardas até a entrada do famoso labirinto.

— Eis o Labirinto de Creta, do qual humano algum jamais retornou! — disse o rei Minos, com orgulho, procurando assustar a vítima.

Uma sólida porta de bronze girou em seus gonzos e Teseu foi lançado para dentro.

— O rei dos atenienses não poderá dizer que fui injusto com seu filho -disse Minos, jogando para dentro do labirinto uma pequena adaga e um escudo. — Fechem a porta! —

ordenou em seguida, enquanto Ariadne lançava um último olhar para seu amado.

Um estrondo anunciou que agora o herói estava inteiramente à mercê do seu adversário, dentro do labirinto. Teseu, procurando familiarizar-se com o local relanceou a vista ao redor.

Imensas paredes de mármore erguiam-se até onde a vista podia alcançar. Passando os dedos pela parede, descobriu que seria impossível tentar escalá-las: completamente lisas, não possuíam a menor fenda onde pudesse apoiar os pés.

Pé ante pé o jovem começou a avançar, após haver recolhido sua adaga e seu pequeno escudo. O chão recoberto de saibro fazia um ruído pouco agradável, que poderia denunciá-lo a todo momento à fera que o devia estar aguardando em algum canto. Ou, mesmo, espionando.

“Estou em seu território, preciso tomar muito cuidado!”, pensou Teseu, enquanto dava os primeiros passos.

Nesse instante, lembrou-se do presente que a bela Ariadne lhe dera na noite anterior.

— O novelo! — exclamou, sem poder conter a satisfação.

Puxando do bolso da túnica o precioso objeto, começou a desfiar o resistente fio, enquanto avançava cautelosamente. Nem bem havia transposto a primeira esquina do labirinto, percebeu que tinha à frente de si pelo menos dez outras entradas — que podiam ser também dez saídas.

Todas eram exatamente iguais, embora cada qual apontasse para um único.

Tomando a entrada da direita, o jovem avançou, cada vez mais decidido. “De que me adianta ficar escolhendo?”, pensou, enquanto ia deixando atrás de si o fio precioso. Ao virar numa das tantas esquinas que já havia ultrapassado, Teseu teve uma desagradável surpresa: algumas manchas vermelhas tingiam as paredes brancas. Uma delas desenhava nitidamente a forma de uma mão humana, que escorria para baixo num borrão indistinto, como se tivesse deslizado os dedos em toda a sua extensão. “Ele matou aqui alguma de suas vítimas!”, pensou, tornando-se mais precavido.

Logo ao virar noutra curva viu os pedaços apodrecidos do corpo daquele que deveria ter morrido às mãos do cruel Minotauro. Bem ao canto estava o pedaço de um crânio, ainda recoberto por uma pequena cobertura de carne. O sorriso branco da caveira luzia, ainda, por entre os seus restos mortais.

Assim, Teseu foi encontrando sinais da fúria da criatura, metade humana e metade fera, que estava à solta por ali, apenas no aguardo de sua próxima refeição. De repente, porém, Teseu sentiu, apesar da espessura das paredes, que alguém se chocara involuntariamente contra o outro lado da parede. “O desgraçado está seguindo meus passos!”, pensou Teseu, empunhando com mais vigor a adaga.

Teseu fez a volta e passou por uma entrada lateral. Quando seus olhos enquadraram o novo corredor, viu ao fundo dele uma mancha escura desaparecer.

— Ei, covarde, volte aqui e me enfrente! — bradou o herói, perdendo a paciência.

Um ruído hediondo, misto de mugido e de grito, ressoou por todo o labirinto. Teseu, não importando com o perigo, saiu no encalço da fera, sem nunca esquecer de ir largando o seu fio.

Andou em círculos, até que sentiu uma pressão no novelo, já diminuto. Voltando-se para trás, Teseu puxou um pouco o fio e sentiu-o leve demais. Puxou de novo somente para ter uma desagradável surpresa:”0 desgraçado rompeu o meu fio!”, deu-se conta. Voltando sobre os seus passos, enxergou o animal e desta vez o observou tempo bastante para distinguir o seu corpo meio humano e meio bovino afastando-se em largas passadas. Subitamente uma idéia lhe ocorreu. Desfiando rapidamente o fio restante do seu novelo, fez com ele um laço e o lançou com tal precisão que ele enganchou-se perfeitamente aos cornos da fera. Segurando com força o laço improvisado, Teseu susteve a corrida do Minotauro, que sacudia a cabeça com fúria, tentando se desvencilhar da armadilha.

Num repelão da cabeça, contudo, o Minotauro puxou com tal força o sólido barbante que Teseu foi puxado para si num vôo violento, que o derrubou quase aos pés da fera. Bufando de ódio, o Minotauro aproveitou-se da desvantagem momentânea do seu adversário e lançou-se com os chifres em riste na sua direção.

Teseu, no entanto, foi mais rápido e desviou-se. Em seguida, pulando às costas do Minotauro, enterrou a sua adaga, com toda a força, entre os seus olhos bovinos. Um mugido de dor atroou as paredes do labirinto, enquanto os dois caiam ao solo, embolados como se fossem um mesmo corpo. Teseu, sem ter a menor piedade, retirou a adaga de entre os olhos da fera e a enterrou outra vez, agora no coração do Minotauro, afastando-se, em seguida, num pulo.

Teseu assistiu com prazer à fera estertorar por alguns minutos, até que erguendo a cabeça do solo o Minotauro pareceu dar um grande espirro avermelhado e cair novamente ao solo, morto para sempre. Teseu, tendo derrotado o Minotauro, retornou para sua terra, levando consigo Ariadne.

No entanto, ao fazer uma parada na ilha de Naxos, ele a deixou lá, seguindo viagem sozinho. Teseu jamais explicou as razões desse ato de aparente ingratidão.

Quando adentrou com seu barco o portão de Atenas, esqueceu de desfraldar a vela branca, conforme o combinado com o seu pai, em caso de vitória. O pobre rei, vendo nisto um sinal certo da derrota — e consequente morte — do seu filho, suicidou-se no mesmo instante, o que roubou ao herói o prazer da vitória. Com a morte do rei, Teseu acabou herdando a coroa, tornando-se assim o novo rei de Atenas.


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