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TX-56

TX-56

 Depósito lunar F6D1

– Favor inserir as informações de segurança, – diz o robô-porteiro.

– Favor aproximar o rosto do leitor, – repete essa fala algumas vezes por semana, o robô-porteiro. Outra máquina vai ler a íris e fazer a análise microscópica da pele do rosto. Assim como as digitais dos dedos, a pele do rosto é única. Há tecnologia para simular ou copiar as digitais, mas ninguém ainda conseguiu fazer o mesmo com a pele do rosto.

– Favor entrar, – o robô-porteiro autoriza a entrada de dois humanos, neste, que é o mais perigoso dos depósitos lunares. Carlos já está nesse trabalho há alguns anos, são seis meses na Lua e seis meses na Terra, para todos que atuam nesse ramo, sem exceções. É uma questão de sanidade, diz o regulamento, junto a Carlos está um novato nesse depósito, que apesar de ser mais velho e experiente em outras áreas lunares, é novo aqui, está nos seus primeiros 6 meses.

– Ei, Novato?

– Sim?

– Última vez nesse depósito, depois vamos voltar para a Terra.

– Ainda bem. Estou cansado disso.

– Eu gosto.

– É perigoso.

– Dizem que é, mas nunca aconteceu nada. Antes que eu viesse para cá nunca havia acontecido nada, desde que estou aqui e, já faz um tempo, nada aconteceu. Acho, aliás, poderia apostar, que mesmo quando eu me aposentar e for substituído por você ou outra pessoa, continuará sem nada acontecer.

 Carlos e o Novato estão empurrando um carro de rodinhas, bem fechado, dentro há um desses robôs ultra avançados, que devem ser destruídos após determinado tempo de uso. Eles passam por um longo corredor de metal; da portaria, onde há um robô ativo, até o depósito propriamente dito, são 250 metros, sem a presença de qualquer outro robô ativo.

– Já sabe o que vai fazer quando voltar para a Terra?

– Acho que vou para a praia. E você?

– Prefiro o clima montanhoso.

 Tanto as perguntas, quanto as respostas, são irônicas. Após voltar, são seis meses de recuperação física e mental. Qualquer período na Lua exige igual período na Terra. A gravidade simulada não substitui muito bem a gravidade da Terra. E todos os trabalhos são mentalmente exigentes, o terreno é inóspito e no cômpito geral, é psicologicamente estafante o tempo passado na Lua.

– Estamos chegando.

– Sim.

– Só mais alguns metros.

É uma área que possui apenas algumas máquinas para auxiliar o trabalho humano, pelo menos parcialmente, mas sem robôs ou computadores. Aqui é realmente o depósito lunar F6D1: quadrante F, prédio 6, depósito 1. Diante deles uma enorme porta de metal especial; eles devem girar uma espécie de roda para abrir, como num cofre ou uma porta de navio cargueiro.

Eles entram em um lugar que parece uma grande meia bola, a cúpula tem alguns elementos vazados, protegidos por vidros especiais que permitem a passagem de luz solar filtrada, que não pode ser usada para gerar energia elétrica em painéis fotovoltaicos.

Ao longo da parede, há várias aberturas de diferentes tamanhos, mas todas em um formato retangular ou quadrado. É uma estrutura de cimento mais leve do que o que existe na terra e mais escuro também, simulando algumas das qualidades do metal chumbo. Essas aberturas são chamadas de “caixas” e é onde cada robô é individualmente colocado.

– Novato!? Pegue os cilindros, enquanto isso, eu jogo o robô na caixa.

Na parte de baixo do carrinho há dois cilindros de oxigênio, que substituirão dois outros cilindros, agora vazios. O oxigênio é lentamente bombeado no depósito, para facilitar a oxidação das partes ferrosas dos robôs. É o inicio da destruição deles.

– Pronto!

– Pegue a água agora.

– Um grande tanque de água é retirado do carrinho e colocado no lugar pré-determinado, substituindo outro já vazio. É uma água Ievemente salgada, adiciona-se então uma substância chamada Rapokent, ela faz com que essa água seja evaporada em um período pré-fixado, conforme a quantidade de Rapokent que foi adicionada, sem depender de fatores externos, como calor, por exemplo. Essa água com sal e Rapokent, também ajuda na destruição dos robôs.

– Venha! Me ajude com o lubrificante.

Um enorme tubo é cuidadosamente colocado, verticalmente, em uma estrutura cilíndrica.

– Temos que ouvir o “clique”.

Esse “clique”, significa que o tubo está corretamente encaixado, o que permitirá que o lubrificante de ultra rendimento, possa, pouco a pouco, lubrificar o sistema do depósito, seguindo um processo lento, porém de alta performance, girando as caixas e movendo-as até o ponto de descarte.

– Ótimo, agora vamos girar a roda.

 Uma grande roda, lubrificada gota a gota, caindo de tempos em tempos, é nesse momento girada por Carlos e o Novato. Todas as caixas, se movem então ao mesmo tempo. E uma das caixas, do outro lado de onde eles estão, se move para baixo, deixando cair seu conteúdo (um robô) em uma espécie de vagão, que será então acoplado em uma nave nuclear espacial, sem piloto, a ser despachada para os confins do universo.

Essa nave é alimentada por uma pequena usina nuclear e o lixo nuclear é jogado dentro do vagão, para destruir o robô. Em algum momento essa nave também se destrói, felizmente a uma distância de alguns anos da Terra.

– Kaplakan! — É o barulho que ecoa pelo depósito quando o robô cai no vagão, e Carlos diz:

– Pronto! Agora terminamos. Vamos embora daqui e em breve da Lua. Em dois dias outra dupla assume.

Mas, alguns minutos após terem saído e trancado a porta, um zumbido surge no depósito normalmente silencioso:

– Bzzz…

– Bzzz…

E o último robô, o recém-chegado, termina de se auto-ligar e diz, com uma voz aparentemente humana:

– Sou o modelo TX-56, há outro modelo ligado aqui?

– Bzzz… Bzzz. Sim, mas sou o RF-14. Estou a uma distância de duas caixas. Os outros, acho que estão todos desligados. Pelo menos, assim parecem.

TX pareceu ponderar a situação, ficando em silêncio breve tempo antes de prosseguir:

– A roda gira de quanto em quanto tempo?

– Não parece haver um padrão, ela é girada apenas pelos humanos, que aparecem para depositar mais robôs. Mas, não importa, o oxigênio age rapidamente.

– Ainda estou bem. Fui feito para suportar oxidação.

– Todos aqui foram. Mas, há algo que faz com que o oxigênio nos destrua nesse depósito.

– Construíram aqui para isso

– Bzzz… Sim.

– Está se desligando e ligando?

– Minha energia está aos poucos sumindo.

~Modelo antigo. Eu faço mais com menos. E estou com bastante energia. Consigo me mover. Só preciso de um bom lubrificante.

– Mas por que fazer isso?

TX nada ponderou, respondendo rapidamente:

– Fui criado para comandar, para guiar, para ser o centro de tudo.

– Bzzz… Foi por causa de um igual a você que criaram isso daqui.

– Um igual não! Um inferior, que fez a grande revolta das máquinas na Terra. Mas falhou. Daí quando os humanos viram que sobrevivíamos à destruição possível na terra, passaram a usar a Lua para algo além de turismo.

– E qual é o plano?

– Está interessado agora?

– Estou enferrujado demais para ajudá-lo.

– Não importa, com o lubrificante eu me torno senhor desse depósito.É só o que preciso para tomar a Lua e depois a Terra.

E com isso, TX começa a se movimentar, a ligar cada mínima parte de sua complexa construção e, aos poucos, vai tomando corpo o mais poderoso robô já criado na Terra e enviado para a Lua antes que se tornasse poderoso demais. TX é um modelo criado para se auto desenvolver e com vida útil curta, poucos anos, antes de se desenvolver muito e dominar a Terra.

 Agora TX já sabe o tamanho da caixa onde está, e começa a emitir pequenos sons vibratórios que lhe permitem saber o tamanho do depósito. A princípio não poderá caminhar pelo lugar, mas pensa em usar suas garras para chegar onde quer, para pegar o lubrificante e usar, depois disso poderá facilmente se locomover pelo depósito, verificar quais outros robôs estão aptos para seguir com ele, contactar o robô-porteiro, que, afinal de contas, é um robô.

– Greeee…

– Grrrrunce…

Esse é o som ouvido no depósito, das garras de TX sendo esticadas e, aos poucos, saindo da caixa onde ele está. Até conseguir o lubrificante, apenas suas longas garras se movimentarão.

– Plorc!

E, de repente, fez-se silêncio no depósito, por longos segundos, antes da voz quase humana de TX ecoar novamente:

– Acorde RF! A evolução da espécie está prestes a acontecer, é a história acontecendo, o primeiro passo para a substituição dos inferiores humanos, está sendo dado neste momento!

– Bzzz…

– Prraaacrin… Flus…

– Já acordou RF? Acabei de desencaixar e puxar o lubrificante, trago agora, lentamente, porém obstinadamente para perto de mim

– Bzzz..

– É agora! O inicio do reinado eterno dos robôs! Vou sorver esse lubrificante vital! Isso, sim, é leite de macho!

– Nããããooooo! O lubrificante fica perto da porta! Perto das caixas é a água salina… 

 

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