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A Maldição Noturna

Ele dormia até ser interrompido pelo som de uma porta rangendo. Treinado para estar sempre em alerta, o soldado abriu os olhos e percebeu uma névoa escura se espalhando pelo quarto. Seu corpo se enrijeceu sem que ele entendesse o porquê. Em meio à paralisia, viu ao fundo dois olhos brilhantes que se aproximavam lentamente, subindo em sua cama. As pernas daquela criatura, em alguns momentos alongadas a mais de um metro e meio, em outros pareciam ter o tamanho de um mero palmo.

A aparição sombria pisou sobre o peito do homem, encarando-o com um rosto oval e enrugado, exibindo um sorriso repleto de dentes pontiagudos. Tinha cabelos brancos, ralos e desgrenhados, lembrando uma velha decrépita de corpo anormal. O soldado gemia; seu corpo tremia em pavor. Tentava gritar, mas nem a voz nem o corpo respondiam aos seus comandos.

Com unhas maiores do que pincéis, a criatura golpeou o pescoço do soldado, tirando-lhe a vida. Minha sorte foi dormir sempre com um punhal à mão, pois ao presenciar essa cena, deitado na cama do outro lado do quarto, tentei me mexer sem sucesso e acabei me cortando superficialmente com a lâmina. A dor do corte rompeu minha paralisia e me permitiu rolar para debaixo da cama, sem fazer barulho.

Ouvi os sons terríveis de outros soldados sendo cruelmente mortos em suas camas. Senti meu corpo voltar a adormecer, não sabia se pelo horror do que presenciava ou por algum odor estranho que pairava no ar e me remetia à morte.

Minha visão turva pelo medo me impedia de definir com clareza a criatura, mas pude notar que ela surgia como uma névoa que se solidificava ao tocar o chão, com passos silenciosos que senti vibrar como tambores. A coisa se aproximou da minha cama, e notei que seus pés eram invertidos. “Que tipo de criatura tem os pés invertidos?”, perguntei-me enquanto um arrepio percorria minha espinha.

Ela apalpou a cama e, não encontrando nada, seguiu de volta até a porta. Quando se foi, meus sentidos começaram a voltar, e, aos poucos, me acalmei. Então, percebi sons de violência do lado de fora da casa: vozes em desespero, chamas crepitando. Levantei-me com cautela, tremendo, e olhei pela janela.

O fogo do lado de fora oscilava em tons de roxo, azul e preto, consumindo tudo. Pessoas corriam desesperadas; consegui ver o pânico em seus olhos. “O que quer que seja, não é humano!”, pensei. De repente, um cavalo atravessou uma enorme fogueira no meio da rua, mas o que vi me fez as pernas bambearem: o animal não tinha cabeça, e no lugar jorrava um fogo roxo. Era um cavalo desenfreado, atropelando pessoas e, por fim, tombou no final da rua.

Respirei fundo. “Não está mais vivo…”, pensei, aliviado. Tentei recobrar a postura e imaginar uma forma de fugir. Eu não era um exímio guerreiro; meus pais me obrigaram a servir. Sempre gostei mais de livros do que de armas e sangue.

Meu vilarejo estava sob ataque e, finalmente, tudo fazia sentido, embora o caos não me deixasse identificar qualquer brasão inimigo. Via apenas rostos conhecidos sendo vítimas de horrores inimagináveis. Até que algo chamou minha atenção: uma mulher corria de alguém usando roupas coloridas, com uma máscara de penacho e uma espécie de molas nos pés, que lhe permitia saltar em meio aos passos.

Em poucos instantes ele a alcançou, e ela em desespero, correu em direção ao fogo na tentativa de despistar o predador. Num último salto, o monstro caiu sobre seus ombros. Ouvi um estalo seco — talvez a clavícula ou o crânio —, mas aquilo não o satisfez: ele a golpeou no peito e na jugular com adagas que carregava.

Em meio às chamas, surgiu um soldado correndo: o General Gobert. Trazia no rosto a mesma expressão de horror que todos os outros, como se encarasse o próprio demônio. Partiu para cima do monstro, que ainda retalhava o corpo da jovem. A criatura caiu para trás já desfalecendo, e Gobert desabou por cima, golpeando o cadáver sem parar. Então, de repente, começou a encarar os próprios braços como se algo rastejasse por sua pele e rolou para o lado, debatendo-se para se livrar de algo invisível.

Pensei em fugir pelos fundos da casa, usando a porta da frente e dando a volta, o que seria simples se eu não estivesse determinado a salvar o General, que se debatia na frente. Aproximei-me da porta e, ao abri-la, voltei a sentir o cheiro estranho da morte. Os sons ficaram mais altos e ensurdecedores. O fogo ardia por toda parte, estava suando, mas tremia de frio.

Ao alcançar Gobert, gritei com ele e tentei puxá-lo para dentro do beco. Ele me mandou ir sem ele, alegando estar amaldiçoado. Franzi o cenho, disposto a argumentar, até que vi minha própria mão, segurando o braço dele, coberta por centenas de larvas brotando de sua pele. Elas subiam em mim, mas ao sacudi-las, sumiram no ar como se fossem fumaça.

Insisti para que o General viesse comigo. Ele se ergueu, grunhindo, sofrendo espasmos, mas me acompanhou. Olhei para o fogo novamente e as labaredas tomaram a forma de demônios fantasmagóricos que devoravam tudo o que chegasse perto. Corremos na direção do beco, certos de que algo nos seguia. Olhei para trás, a visão turva pela adrenalina, e vi uma criatura sendo cuspida do chão próximo às chamas. Meus sentidos não pareciam capazes de descrever tamanha bizarrice.

Um ser rejeitado pela terra, de rosto retorcido, nos encarou e soltou um brado tão forte que minhas pernas cederam. Caí de joelhos, atordoado. A criatura continuava gritando, abrindo a bocarra descomunal em um ângulo impossível para um humano. Ali, tive a certeza de que algo sobrenatural nos atacava.

Ele avançou em minha direção, estendendo a mão. Seus dedos se desfaziam em névoa conforme se alongavam. Tentou me agarrar, mas o General, ainda de pé, entrou na frente. Ouvi o som das garras perfurando carne.

Gobert, de costas para mim, deixou cair os braços como se perdesse toda a força. Gritei, e as lágrimas nublaram minha visão. Mas, em um último suspiro, ele puxou uma adaga de suas vestes e golpeou o pescoço do bradador. Não esperei pelo desfecho: aproveitei o instante e me levantei para correr.

Atravessando o beco apertado, sentia tudo girando; as casas deixavam uma fresta estreita de céu visível. No entanto, ao olhar para cima, não vi o céu, mas um enorme olho que me observava. Estremeci. Só consegui enxergar sua pupila prateada, e isso me fez surtar.

Tropecei novamente, e, em meio a minha epifania, olhando para aquilo que só se enquadra em proporções celestiais, ouvi vozes conversando em tom normal. Aquilo me chamou a atenção. Rastejei até os fundos da casa e tentei ouvir. Era uma garota, com não mais de duas décadas de vida, conversando com um homem de meia idade. Percebi, então, que meu corpo de alguma forma havia se libertado dos efeitos alucinógenos que eles espalharam pelo ar, e compreendi todo o plano.

Eles vestiam roupas extravagantes, cada um com uma máscara peculiar. Queria mata-los ali mesmo, mas não tive forças para atacá-los; só me restava observar e me esconder. Eram saqueadores noturnos que usavam suas artes alucinógenas para anular qualquer forma de defesa. Chamavam-se Momos.

Agora, dedico minha vida a rastrear e matar cada um desses monstros que devastaram meu povoado.

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Avaliações

2 avaliações encontradas.

Plot Execução Escrita Estilo Desafio

Algumas observações pontuais sobre o texto, depois, minha avaliação a cada critério:

– o narrador, no início, descreve com exatidão a criatura, pra logo depois dizer que não conseguia vê-la com clareza
– com a quantidade maluca de coisas bizarras acontecendo, só no final do conto o cara se convence de que algo sobrenatural estava acontecendo? Pouuxammmmm

– tirar vírgula de “aproximou da minha cama”; “começaram a voltar, e”; “Então, percebi”; “Gritei, e”; “Tropecei novamente, e”

– vírgula depois de “e no lugar”; “Em poucos instantes”

– ponto e vírgula: “por toda parte”;

– acento em “Queria mata-los”

– trocar: “enquadra” por “enquadrava”;

PLOT
Gostei do plot: basicamente, um vilarejo é atacado por criaturas mágicas com substâncias alucinógenas e, ao que parece, as alucinações são sólidas o suficiente para matar os galerinhas

EXECUÇÃO
Há muitas coisas confusas, como o cenário, os vilões e o poder das alucinações. Nenhum personagem é muito bem desenvolvido. A estrutura não foi bem preparada para o máximo impacto (mal pude detectar o clímax). Só há um assunto, que é a própria premissa, sem nenhum tema ou subtramas. O roteiro, em si, não parece ter furos, mas o narrador foi incoerente duas vezes.

ESCRITA
Anotei algumas correções, mas é pouca coisa e em situações que não tornam as frases ambíguas, não comprometem o entendimento.

ESTILO
O narrador não é muito coerente. O texto não apresenta muitos traços estilísticos, mas não é pobre.

DESAFIO
Tem elementos típicos de histórias fantasmagóricas, apesar de não ter algo literalmente fantasmagórico, mas, sim, monstros de todo tipo.

Plot Execução Escrita Estilo Desafio

No geral, é uma cena muito bem escrita e descrita, mas sem desenvolvimento.

Pontos positivos:
* Uma cena muito bem escrita e descrita, com palavras bem escolhidas e metáforas bem utilizadas.
* Boa utilização de diálogos diretos e indiretos, contribuindo para o andamento da narrativa.

Pontos negativos:
* A descrição se estende até a metade do conto com pouca ou nenhuma ação.
* O personagem narrador não faz nada além de observar e narrar, o que não permite que ele seja bem caracterizado.
* Não tem uma construção de tensão, nem um clímax, nem resolução.
* Quando ele diz que tudo fazia sentido, eu não entendi do que ele estava falando.
* Como ele sabia que a criatura se chamava bradador? É possível que o narrador tenha mais informações do que o personagem, já que o narrador é o próprio personagem no futuro. Porém é interessante que o narrador em primeira pessoa apresente os pensamentos e as dúvidas do personagem.
* Como ele descobriu que estava sob efeito de alucinógenos e que a garota e o homem espalhavam essas substâncias? Como ele descobriu todo o plano? Como assim “momos”? Ele já conhecia a lenda?

Recomendações:
* Criar um enredo com começo, meio e fim, que tenha pelo menos um conflito principal e uma resolução. Mesmo que esse conto seja o início ou uma recordação de uma história maior, é interessante que o conto tenha um conflito e uma resolução.
* Atentar-se para o foco narrativo, ainda mais na narração em primeira pessoa. Não descreva o que o personagem não conhece ou não entende. Ao contrário, descreva ou melhor ainda: mostre a confusão do personagem diante do desconhecido.