Em agosto de 1994, a lua cheia iluminava o céu de Minas Gerais atenta ao que haveria de vir. A Fazenda São Cipriano, localizada nos arredores de Vila Rica, uma pequena cidade ao sul de Ouro Preto, estava abandonada havia mais de 50 anos. Durante o dia, a fazenda era apenas mais um conjunto de ruínas esquecidas, mas ao cair da noite, ela parecia respirar ofegante, aguardando mais um episódio do que quer que fosse. Somavam-se muitas lendas urbanas sobre o lugar “amaldiçoado” e os moradores evitavam passar por ali. Diziam que o centro do problema era o poço, de onde muitos diziam ter ouvido lamentos e gritos, e onde jazia algo que nunca deveria ser perturbado.
Arthur Albuquerque, formado em engenharia hídrica pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), não se deixava levar por superstições. Aos 34 anos, Arthur era um homem prático e gostava de pensar em si mesmo como alguém “moldado pela lógica e pela ciência”. Em uma época em que as planilhas de Lotus 1-2-3 e diagramas feitos em AutoCAD dominavam sua rotina, ele usava um laptop IBM ThinkPad para registrar cada passo do seu trabalho. Foi contratado para avaliar a possibilidade de transformar a fazenda em um projeto de irrigação moderno para cultivo de café. A fonte de água seria aquele poço, de reputação macabra.
Quando Arthur chegou à fazenda com sua equipe, o lugar parecia um mausoléu. O cheiro de mofo e terra encharcada era quase sufocante. No centro do quintal, o poço estava coberto por uma tampa de madeira podre, envolta por trepadeiras. Ele puxou um medidor portátil e um gravador de fitas para registrar suas anotações.
— Profundidade estimada de 12 metros. Estrutura parcialmente comprometida, mas potencialmente utilizável.
Quando jogou uma pedra para medir o tempo de queda, não ouviu o som que esperava. Ao invés disso, veio um gorgolejo baixo, seguido por algo que parecia um suspiro humano. A equipe riu — de nervosa.
— Deve ser algum animal lá embaixo — disse um dos ajudantes.
Arthur ignorou o desconforto crescente e continuou seu trabalho. Durante a noite, enquanto revisava seus cálculos na tela monocromática do laptop, começou a ouvir ruídos vindos do quintal. Pensou em ignorar, mas a curiosidade o venceu. Com uma lanterna Maglite, seguiu os sons até o poço. Dessa vez, as trepadeiras pareciam mais grossas, até pulsantes, e o ar ao redor estava gelado. Não demorou para desistir e voltar.
Naquela mesma noite, Arthur teve o primeiro pesadelo. Sonhou que estava dentro do poço, submerso em uma água densa e carmesim. Ao seu redor, sombras humanas flutuavam, olhos esbranquiçados e bocas que murmuravam palavras em uma mistura de latim e algo que ele não compreendia. As vozes repetiam a mesma pergunta: “Por que você voltou?” Quando acordou, estava com terra sob as unhas e um corte superficial na palma da mão. Ficou confuso.
No dia seguinte, Arthur decidiu investigar. Preparou corda e lanterna, e desceu ao poço, contra os protestos da equipe. Quando chegou ao fundo, viu que as paredes estavam cobertas de runas e marcas gravadas com dificuldade, talvez com instrumentos improvisados.
Algumas pareciam recentes.
Ele respirou fundo e continuou até terminar a descida. No centro do chão, havia uma pequena câmara que exalava um cheiro de enxofre. Dentro dela, algo brilhou: um anel de ouro, gravado com palavras que teve dificuldade de ler à luz da lanterna. Mas não teve dúvidas sobre a inscrição: Círculo de Cipriano.
Ao pegá-lo, Arthur sentiu uma tontura forte e já não tinha certeza do que estava fazendo. De repente, ele estava em outra época. Via flashes de uma história que não era sua: uma mulher acusada de bruxaria, amarrada e jogada no poço; um fazendeiro tomado por ciúmes, assassinando o próprio irmão; criados torturados para nunca revelar os segredos da casa. O poço não era apenas um lugar, era também um acesso para uma teia de dor e sofrimento que se alimentava daqueles que se aproximavam.
Quando foi puxado de volta à superfície, Arthur não era mais o mesmo. Seus olhos estavam vazios, sua pele pálida. Ele segurava o anel com tanta força que o objeto havia cortado sua palma. Não disse nada, mas quem o olhava via que algo o havia deixado incompleto, como se parte de sua alma tivesse ficado lá embaixo.
Naquela noite, os moradores de Vila Rica juraram ouvir gritos vindos da direção da fazenda. Alguns disseram ter visto uma figura feminina, com cabelos desgrenhados e olhos de fogo, pairando sobre o poço. A lua, antes branca, estava agora vermelha como sangue; dava a impressão de uma cicatriz no céu.
Dias depois, Arthur desapareceu sem deixar rastros, mas o anel foi encontrado na entrada da cidade, junto com seu gravador. Quando as fitas foram ouvidas, tudo que se ouvia eram murmúrios e risos que ecoavam como um coral infernal.
O poço foi lacrado pelas autoridades, mas quem passava perto ainda sentia o ar gelar e ouvia o chamado de algo que não pertence a este mundo, esperando pelo próximo curioso que ousasse acordá-lo.
*****
Ano 2123. A Fazenda São Cipriano agora era apenas um marco esquecido em antigos mapas digitais. Situada próxima à cidade de Vila Rica — hoje, uma metrópole tecnocêntrica rebatizada como Cidade dos Vales —, sua história era um arquivo obsoleto em servidores de realidade aumentada, acessado apenas por caçadores de lendas urbanas e historiadores amadores.
Uma nova expedição, liderada por um grupo de cientistas e tecnólogos, foi financiada pelo Instituto Global de Preservação Histórica. Equipados com drones autônomos, exoesqueletos para exploração de terrenos instáveis e scanners de energia subterrânea, a equipe pretendia desvendar a verdade sobre o famigerado Poço de Sangue. Os registros sugeriam eventos inexplicáveis, mas a ciência moderna, com seus sensores quânticos e IA avançada, acreditava poder solucionar o mistério.
A líder da missão, Dra. Cecília Navarro, era uma arqueóloga forense obcecada por fenômenos inexplicáveis. Em sua equipe estavam também: Victor Kwon, um especialista em bioenergia; Luísa Mendez, linguista com foco em idiomas mortos; e Nathan Cole, um programador de IA que projetava robôs semiautônomos. Eles não acreditavam em fantasmas, mas eram fascinados pelo poder dos mitos de moldar a história humana.
Ao desembarcar na área, a paisagem era quase alienígena. A antiga casa principal havia desmoronado e as árvores ao redor pareciam dobradas como se buscassem fugir do poço, agora coberto por um domo de metal corroído que rangia com o vento. Drones sobrevoaram o local, mapeando o terreno. O scanner subterrâneo revelou algo inesperado: o poço não tinha fundo definido, mas abria-se em uma rede de túneis que pulsavam uma energia que confundia os instrumentos.
— É eletromagnetismo natural — disse Victor.
Ele tentava soar confiante, enquanto ajustava seus óculos de realidade aumentada. Mas o olhar no rosto de Cecília era mais cético. Aquela oscilação não parecia normal.
Usando seus trajes especiais, Cecília e Nathan desceram ao poço. Dessa vez, um drone equipado com sensores de espectro total os acompanhava, mapeando o ambiente em tempo real. O fundo parecia recoberto de um líquido escuro que refletia as luzes como espelhos partidos. Cecília tocou o material com um bastão coletor.
— Não é água, nem óleo. É algo… vivo?
De repente, os monitores do drone começaram a exibir palavras em latim arcaico e sumério, piscando em sincronia com os sinais vitais dos exploradores. Luísa, que estava na superfície, traduziu em voz alta:
“Você não veio buscar respostas; veio por que eu chamei.”
No mesmo instante, o líquido começou a subir lentamente pelas paredes do poço, como se os observasse. Cecília gritou para que Nathan subisse, mas ele parecia paralisado, encarando a escuridão.
— Eu vi algo… uma mulher. Ela está me chamando pelo nome — murmurou.
Na superfície, Victor ajustou os sensores para ler as flutuações de energia. O padrão era similar a ondas cerebrais humanas, mas amplificado de uma forma absurda.
— Isso não é apenas energia, é consciência — ele concluiu, aterrorizado.
Os drones começaram a falhar, capturando apenas imagens distorcidas e sons que se assemelhavam a risos misturados com gritos.
Luísa, enquanto traduzia mais inscrições transmitidas pelo drone, encontrou algo perturbador: referências a um círculo de sangue que conectava gerações através de sacrifícios.
— O que quer que esteja aí embaixo, tem fome de almas e… e parece reconhecer vocês — ela disse, observando o anel na mão de Cecília, que havia sido encontrado em uma expedição anterior.
No fundo do poço, Nathan desapareceu em um redemoinho de sombras e líquido vivo. Quando Cecília tentou alcançá-lo, foi puxada para trás, não por braços humanos, por memórias: uma mão idosa, uma mão infantil, uma mão que ela reconheceu como a de sua falecida mãe.
— Venha. Aqui é o princípio e o fim — murmuravam as vozes.
Na superfície, a equipe tentou evacuar, mas o solo ao redor da fazenda começou a desmoronar. O poço crescia, engolindo tudo. Cecília, em um último esforço, ativou um scanner cerebral pessoal, transmitindo suas últimas impressões para o sistema central da equipe. Sua última mensagem dizia:
“Não é um lugar. É um ser. Ele vive e consome. Nós somos sua eternidade.”
Dias depois, a fazenda desapareceu completamente, deixando um buraco negro no terreno que desafiava a gravidade. A transmissão final da expedição foi recuperada, mas nenhum cientista conseguiu interpretar os dados. Vídeos mostravam rostos humanos emergindo do líquido, falando em línguas perdidas, enquanto o ambiente vibrava com um hino distorcido que parecia misturar cânticos gregorianos com algo infernal.
Os poucos que assistiram ao material relataram insônia, paranoia e alucinações. A área foi lacrada e declarada zona proibida pela Aliança Global. Mas, em noites sem lua, moradores de Vila Rica afirmam ouvir risos e lamentos vindo do que agora chamam de “O Abismo dos Homens Perdidos”.
E o anel que Cecília usava foi encontrado, misteriosamente limpo, no meio de uma praça em Vila Rica. A inscrição parecia ter mudado: “A história nunca termina; ela só muda de rosto.”
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2 avaliações encontradas.
Plot Execução Escrita Estilo Desafio
Plot Execução Escrita Estilo Desafio
PLOT: Foi um dos poucos contos que eu gostei do plot, apesar de me cheirar gpt. O plot tem duas partes, cada uma daria um conto bom.
EXECUÇÃO: A execução do plot foi excelente, apesar de ter umas coisas estranhas. Mas vamos lá: são 2 estruturas em 3 atos, o que é bem interessante. Mas será que isso não foi gpt? Se foi, ao menos foi bem administrado. A simbologia interna é boa, a começar pelo nome da fazenda (na simbologia, só não me fez nenhum sentido o anel, que vem e vai do nada, sem conexão com o resto). Tem uma desconexão entre a frase que fala dele “armado” com a lanterna e a continuação do texto. Precisa arrumar isso. Ah, e que diabos é essa segunda equipe que chega lá? Tem até uma linguista! Isso ficou muito inverossímil (ao menos assim, jogado). No parágrafo “Luísa, enquanto traduzia…” toda a descrição soa aleatória, expositiva e forçada, assim como na parte “O que quer que esteja aí embaixo…”. O final é típico demais.
ESCRITA: A escrita tem cara de gpt, mas alguns erros típicos de gpt, como vírgulas excessivas e uma sintaxe bem, bemmmm evidente da IA. Tem uso de “há” quando deveria ser “havia” (outro erro típico do gpt). Algumas escolhas de palavras me deixaram animado na leitura, como “veio um gorgolejo baixo”. O gpt mais acerta do que erra na gramática, mas precisa de revisão dobrada.
ESTILO: Gostei das descrições personalizadas do local e dos detalhes tecnológicos. Só tem, de novo, que cuidar o uso do gpt. Tem muita coisa na cara dura (“Durante o dia, a fazenda era apenas mais um conjunto de ruínas esquecidas, mas ao cair da noite, ela parecia respirar ofegante”). No estilo da escrita em si, não tem exageros, é tudo bastante claro.
DESAFIO: 10 de 10 no cumprimento do desafio.