Guilherme era um rapazote apaixonado por belas moças e boas viagens. Passando por uma cidadezinha portuária escutou falar de uma tal praça do Fruncuneiro onde havia um espírito preso numa estátua. Este fantasma era conhecido por seus conselhos, mas tinha uma condição: levar um pouco de rum pra estátua logo depois da meia noite. Curioso com a história, Guilherme decidiu testar se era verdade. Quando a meia noite estava próxima, comprou uma garrafa de rum em um barzinho próximo e foi até o tal Fruncuneiro.
Chegando lá encontrou uma estátua de bronze, um imponente do pirata segurando seu sabre ao alto enquanto levava um trago do rum com a outra mão.
— Senhor espírito, eu trouxe o rum que falam na história. Você está aí?
— Que nada de senhor nada, rapaz. Eu sou um jovem de quinhentos e poucos anos muito bem preservado, viu? O último polimento da estátua não foi nem dois meses atrás e você chega me chamando de senhor? Olha que eu não sou de levar desaforo hein!
— Me desculpe, ó juveníssimo fantasma. É verdade que o senhor dá conselhos aos mais jovens?
— Pra mim qualquer um é mais jovem meu filho, até mesmo aqueles velhos caducos que trazem aquele rum horrível, perfeito pra limpar a sola da bota
— Sabe, tem uma moça que eu estou gostando e eu não sei se ela…
E o fantasma cortou-lhe a fala:
— Sabe garoto, certo dia eu também amei, Não sei quantos anos se passaram, você não é o primeiro amante a vir me pedir conselhos. Eu era marujo num navio chamado Gibraltar da Listra Marrom, nome estranho né? Era um galeão feito da melhor madeira da época. Listra marrom, pois teve um dia que um raio atravessou o mastro e deixou uma listra de queimado na madeira. Nós, marujos, preferíamos chamá-lo de Desgraça Vermelha, já que é isso que ele era. O convés do navio tinha um cheiro de morte por causa das loucuras de João Jaqueta, nosso capitão. Aquele homem era mais estranho do que qualquer outro pirata que já vi. Ele usava uma jaqueta como a sua e falava que tinha nascido em um mundo onde os mares haviam sido esquecidos. Os homens de sua época eram desbravadores dos ares. João Jaqueta também tinha um ajudante que chamava de Ferrolho Esbuga. Era o contra-capitão do navio e parecia ser um homem todo de ferro. Talvez se lhe cortasse o bucho não sairia mais do que parafusos. O cheiro de morte do convés vinha de um caixão que ele levava de um lado pro outro. Os marujos achavam que dentro daquela geringonça tinha algum navio das histórias do capitão, um dos que voam mas estava quebrado; às vezes as histórias do João Jaqueta iam tão longe que os coitados até acreditavam.
— Você não ia falar da história de amor?
— Ah é! Então, certo dia estávamos atracados no porto de uma ilha cheia de moças bonitas, qual era o nome mesmo? Hm… enfim, estávamos nessa ilha e João decidiu sumir. Ferrolho Esbuga nos proibiu de sair da ilha até achar o capitão.
— A moça.
— Ah, isso, isso! Eu vi aquela moça linda que nem um morango. Ela brilhava mais do que todas as outras donzelas da ilha, e olha que não “era” poucas as belezas hein, he he he… Todo dia quando todos iam dormir nos encontrávamos. Eu ficava esperando debaixo d’uma ponte de madeira numa falésia. Ah, que mulher maravilhosa! Sempre que eu a via meu coração batia mais forte e toda vez que nos despedimos eu desejava morrer à deixá-la
— O que aconteceu depois?
— Aconteceu o que sempre acontece né meu filho. O João Jaqueta apareceu falando que tinha pegado mais um pouco de “combustível temporal”. Nome engraçado né? E que estavam próximos de voltar ao seu mundo. Logo partimos da ilha e todas as mulheres da ilha revelaram. Eram sereias e amaldiçoaram cada um dos homens do Desgraçado Vermelho. Todo solstício de Inverno teriam de trazer o peso de três homens em ouro e se não fizessem nunca mais amariam mulher nenhuma em suas vidas. O único que não sofreu a maldição, fui eu.
João Jaqueta e o Ferrolho Esbuga sumiram junto com o caixão e a tripulação debandou. Alguns continuaram sendo piratas e morreram todos na grande guerra dos mares; outros abandonaram o mar e fizeram família na terra. Eu fiquei no meio; dois meses depois da debandada, naufraguei numa ilha de inverno e por um milagre encontrei lá a minha sereia amada. Vivemos um bom tempo juntos. Tive dois moleques com barbatana de tubarão e duas sereiínhas, uma tinha a cauda vermelha e amarela, a outra nasceu com tentáculos de polvo. Ah! E também tive um moleque com cabeça de homem e corpo de caranguejo, mas esse era muito violento e tivemos que jogar ele no mar.
— E como você veio parar aqui?
— Ah, essa história é a mais curta. Esse filho que deixamos ir para o mar se tornou inimigo de todos habitantes da água e tentando atingir ele, a rainha das lulas, uma grande feiticeira, lançou uma maldição em mim e na mãe do moleque.
— Qual maldição?
— Cada um de nós passaria mil anos de maldição. Eu ficaria mil anos preso em uma estátua e ela passaria o mesmo tempo numa ostra no fundo do mar. Depois de 50 anos um padre descobriu a situação e me libertou da maldição. Eu preferi ficar por aqui mesmo pra esperar minha morena. Ela me mataria se descobrisse que fiquei zanzando por aí por tanto tempo. Aquilo ali é o sol? Que horas são?
— Faltam trinta minutos pro galo cantar.
— Ah! Eu preciso ir logo, se não o cachorro do ceifador vai me morder de novo! Ele obriga os fantasmas a sumirem de dia. Até mais, Guilherme? Era Guilherme, né?
— Sim. Até mais, Fruncuneiro!
— Ei! Mudaram o nome da praça? Ah, aquele maldito prefeito, ele se vê comigo! É FRUCUNEIRO, não Fruncuneiro! Frucuneiro Albixeirre da Grósta Terceiro! Onde já se viu, Fruncuneiro…
Um rosnado tenebroso soou na praça.
— AAAAAAAAAH! É O CÉRBERO! TCHAU!
E voltou para a estátua de bronze.
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Plot Execução Escrita Estilo Desafio
O plot é divertido, mas não é tão bem executado (construção de cenário, personagens etc.) por causa do espaço perdido com as falas aleatórias do espírito. Falta ação, falta coisa acontecendo. As falas, por sua vez, são divertidas (acabam cumprindo outro papel). O original teve muitos deslizes na escrita: vírgulas, pontos, acentos etc. O estilo da narrativa do Hiel está melhorando bastante (ansioso pra ver os próximos). O desafio cumprido, já que tem um espírito do início ao fim como protagonista, mas o tom cômico tira a sensação do fantasmagórico, de certa forma. Na verdade, em poucos momentos a gente tem a sensação de que a conversa é com um espírito.