A Espera de Ailin

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Descrição

Sua atenção naquele momento dera a ela uma paciência jamais tida antes. Estar tão próxima da verdade transformava sua ansiedade e obsessão em vitória. De onde vinha aquela confiança? Difícil saber. Saboreava cada detalhe e quase via beleza em meio àquele ambiente tão hostil. Um zumbido ameaçador aumentava a cada passo.

Atenta e cautelosa, lembrou do muito que aprendera com seu amado. Lembrou-se da calmaria que sempre se repetia quando estava submersa no rio de águas doces dos seus lábios; da quietude ao senti-lo se aproximando vez após vez.

Agora, era necessário trilhar quão misteriosa estrada, mas o terror e assombro dos momentos findos ultrapassados tão pouco tempo antes foram tão poderosos que o lado sombrio do presente trajeto lhe pareciam mero fruto de abandono e descuido. Afinal, não era uma estrada para a apreciação. E quantos teriam, como ela, momentos anteriores tão mais assustadores que tornassem a passagem menos delirante?

Continuou. De novo: aquelas espinheiras, as mesmas pedras, um barro frio, as cores mórbidas, o zumbido desmotivante. Prossegue. Foi duro, pareceu à toa. Mas só podia ser ali… tinha que ser ali. O zumbido sumiu? Mas que…? – É aqui! – grita.

– Ele estará aqui!

O brado ela entoa, mas só com a vontade, reclamando o direito à alegria.

Não se incomodava mais. O frio, as cores lúgubres e o odor quase agressivo não eram mais nada. E, agora, sentia aquela energia, a mesma que já conhecia de tantas vezes antes tão próxima da estrada, mas desistente.

Quão diferente estava daquelas versões de si mesma que ali estiveram vezes antes!

Pensamentos mais profundos a aguardavam a poucos passos. Em poucos segundos, já conceberia sem privações e sem embaraço as sensações que a rondavam, com sentimentos de uma jovem amante, tão, tão jovem, que apenas ambicionara o simples, o puro, o belo…

Novamente vê-se livre. Agora, definitivamente. As lágrimas não param: vêm cobrindo de alívio, levam a dor e a ansiedade… ah! Como sente-se viva! Sim. Mais que antes! E as memórias voltaram. Todas elas. A pintura estava quase perfeita, só não tinha aquele encanto.  Êxtase – esse era o momento! O momento que, no fundo, parecia saber existir, por tão ardente desejo de que existisse. Sim.

Banha-se do instante como se fosse o último banho, mas sabe que o acaso nada é, senão mero lacaio da providência. Aguardaria ali, mais quieta impossível, mas sedenta. Ele também virá. Sabia.

Como sabia, tomou coragem e adentrou o vale após ter consultado a opinião do companheiro que a levara. Aquela sensação que nunca parava, aquela força dentro do peito que implorava por uma atitude em busca de desvendar o mistério. O mais difícil realmente foi a decisão de entrar, mas tendo feito, tudo certo. Tudo novo.

Aguardaria. Sabia. Sentiu-se também desmotivada, pois estar ali depois de tantos dias pensando sobre aquilo tudo e não ter visto, ouvido ou sentido nada tão demais era desanimador. Antes que se arrependesse, levantou dali e foi explorar.

Agora, com mais percepção e mais maturidade, muita coisa pareceu perigosa. As decisões haviam parecido tão naturais, mas agora, tão irregulares.

Foi um caminho final longo e de pedras com pontas afiadas voltadas para cima, algumas plantas espinhosas e venenosas. O caminho havia ficado cada vez pior, e agora, o lugar também passava uma sensação sufocante. Quanto mais devagar seguia, menor era a vontade de continuar. Seu silencioso acompanhante permanecia quieto.

De repente, o aspecto tenebroso, sujo e perigoso do lugar pareceu se dissipar. Era ainda o começo da manhã interminável e o tempo nublado foi sumindo, dando lugar a uma iluminação amena, assim como a baixa temperatura logo foi substituída por um clima agradável que tornava o lugar mais aceitável. As pedras já tinham ficado para trás e nem notou quando a vegetação se tornou tão bela. Um zumbido que a incomodava já a muitos passos se tornou mais intenso, quase dolorido, mas quanto mais adentrava o lugar, mais tinha a impressão de que ele sumiria. Por fim, o zumbido desapareceu. Porém, não foi só o zumbido: não havia nenhum som. Tudo se repetiria? O vazio do caminho antes do caminho a alcançaria outra vez?

Não. Claro que não. Impossível descrever bem como foi receber todas aquelas informações, todas as memórias, relembrar todos os sentimentos, entender sobre tudo que passou por tanto tempo. Lembrar-se daquele menino meigo que compartilhava dos mesmos sentimentos, que estaria naquele exato momento sofrendo como ela sofreu, sem rumo, sem explicação, angustiado, ansioso… chamado de louco. Louco? Sim. Bem, talvez.

Amava-o. Agora sabia, mais que antes: era definitivo. Amava-o não apenas de forma passiva, mas com decisão, com o movimento que o amor exige e da forma como o amor é: não uma mera sensação ou sentimento, não o fruto de inclinação dos desejos, nem a óbvia tentativa de satisfação, mas a escolha, a ação, o zelo, a decisão…

Suspirava e, sem palavras, comunicava. Ainda que não pudesse compartilhar o som de seu choro, de tão amarga sina vivida, de tão deliciosa redescoberta e de tão doces palavras, gritava no silêncio. Mas sabia. Viria. Sim, viria.

Lamentava que, mediante tantos avisos em sua mente e em seu corpo, suas medidas não tivessem sido mais eficientes. Como era possível tanto sentimento sem vê-lo, sem tê-lo, tão longe? Devia apenas observar e superar o amargor, à espera de uma felicidade e paz talvez inalcançáveis fora dali.

Os minutos passavam lentamente e podia saborear perfeitamente cada instante as suas convicções, imaginando onde estaria seu amado.

Ah! se soubesse quão perto ele estava…

O abraçará, quão forte! Que entrega! Será real? Ela crê; bastaria.

Será intenso, belo, quente e… o resto não se narra… será puro!

Conhecerão algo novo, mas antigo; natural, mas só deles. Sem segredos, tudo se desvenda: descobrirão, serão um só. Explodirão em sabor.

O Silêncio só observa. É a causa e é grato.

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